terça-feira, 3 de março de 2015

FALHARAM OS ECONOMISTAS OU FALHOU A MACROECONOMIA?

(Frances Coppola)


Frances Coppola é uma blogger hiperativa e militante, depois de como ela diz na sua apresentação no Coppola Comment trabalhar durante 17 anos para bancos e começar depois a escrever sobre eles. Frances reparte a sua atividade entre o já referido Coppola Comment e o Pieria, este último institucionalmente mais reputado, pois envolve outros economistas como, por exemplo, Jonathan Portes, diretor do National Institute of Economic and Social Research do Reino Unido. A hiperatividade de Frances é ilustrada por exemplo por ser escritora e cantora, com outros dois blogues, o Singing is Easy, dedicado à sua costela musical e o Still LIfe with Paradox, onde escreve sobre coisas da vida e da moral.
Nos últimos dias de fevereiro passado, Frances assinou no Coppola Comment um artigo que reproduz a sua conferência na Universidade de Manchester sobre as agruras da macroeconomia em debate com o aqui repetidas vezes referido movimento crítico de estudantes de economia daquela universidade, o Post-Crash Economics Society.
Frances discute o enorme criticismo com que os economistas e a economia em geral foram olhados após a crise de 2007-2008 e sobretudo após a convicção generalizada de que afinal a turbulência não tinha desaparecido das economias de mercado e que os economistas e bancos centrais não tinham o domínio que pensavam que tinham dessa turbulência.
O que é curioso é que a acusação resulta de uma compreensão errada do que cabe aos macroeconomistas fazer. Muita gente se interrogou porque é que os economistas não foram capazes de prever o fenómeno para o melhor combater. É uma abordagem errada ao problema. Os macroeconomistas não são “forecasters”, embora muitos deles se entreguem a tarefas pesadas de construção de modelos macro de suporte à previsão macroeconómica e também muitos deles não resistam à tentação de se transformarem em gurus da previsão para encanto de alguns papalvos ou do jornalismo económico mais sensacionalista.
Mais do que uma falha dos economistas, Frances Coppola tem razão quando defende que há sim uma falha clara da macroeconomia mais corrente. E a falha não acontece porque ela não foi capaz de prever a exuberância irracional (na feliz expressão de Schiller) dos mercados financeiros que precipitou 2007-2008. Há falha porque os macroeconomistas não incorporaram os ensinamentos da história económica e sobretudo a vastíssima literatura produzida ao longo dos tempos sobre as más e boas práticas de política monetária seguida no período imediatamente anterior à Grande Depressão de 1929 e na recuperação dessa tragédia macroeconómica. A macroeconomia falhou porque se negou a entender os sinais evidentes de uma recuperação anomalamente lenta e anémica, que custou uma brutalidade de destruição de riqueza e situações de grave degradação das condições de vida de um número infindável de cidadãos. Falhou porque continuou impávida e serena numa inércia trágica de construção de modelos macro assentes em agentes representativos, que não são representativos de comportamentos económicos instalados nas economias reais. Coppola refere que a economia dos comportamentos está a dar os seus primeiros passos, sobretudo porque necessita de uma profunda realimentação de investigação empírica de comportamentos económicos reais em épocas de turbulência que não eram afinal uma realidade do passado.
Frances é uma militante das ideias e não propriamente uma investigadora económica. Mas a comunidade de práticas da macroeconomia tem uma necessidade profunda de quem abane o pensamento estabelecido e o retire do sossego acomodatício. Compreende-se que a crise de 2007-2008 e seus prolongamentos e derivas europeias abalaram vidas de investigação dedicadas a provar o contrário do que a realidade esmagadora acabou por confirmar. Não é por acaso que os sinais de luz macroeconómica tiveram origem ou em personalidades esquecidas e fora do mainstream económico, aquele que se reproduz nas cadeias de montagem das revistas acríticas e não atentas ao contrafactual dos nossos dias, ora em personalidades reconhecidas academicamente mas com reduzido peso de influência política através das ideias.
Falhou a macroeconomia e falharam os posicionamentos políticos que se apoiaram na inércia e não na dinâmica do pensamento.

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