Nestes tempos mais próximos, tenho a atenção e o
foco da reduzida pesquisa que o trabalho me permite no tema das classes médias
e na tendência para a sua erosão, sobretudo após os acontecimentos de
2007-2008. O prolongamento do projeto de investigação para a OIT de Genebra em
que participei com a Pilar González sobre os efeitos da austeridade, e que
estará a ser publicado por estes dias na prestigiada Edward Elgar, evoluiu no
sentido de um foco mais aprofundado no tema das classes médias e na tendência
para que esses grupos sociais percam rendimento, influência e poder de ascensão
social, com sérias consequências para a plasticidade das economias de mercado.
A análise estritamente económica da classe média
levanta aos economistas o problema da sua identificação quantitativa. A
distribuição do rendimento continua a ser um indicador fundamental para a
definição de classe média. No projeto OIT em que estamos envolvidos (nesta fase
com a companhia do Luís Delfim Santos e do meu filho Hugo Figueiredo
(Universidade de Aveiro), a direção do projeto optou por um intervalo para meu
gosto demasiado largo da distribuição do rendimento. Tomando como referência o rendimento
mediano das economias, classe média será para o projeto em questão o conjunto
de indivíduos com rendimento compreendido entre 60% e 200% do rendimento
mediano, o que obriga a uma estratificação pelo menos entre classe média baixa
e classe média alta.
O nosso foco de sistematização de informação de
base passa neste momento por ventilar o comportamento recente da distribuição
do rendimento, designadamente a evolução dos padrões de desigualdade que a
crise e as políticas de austeridade têm determinado, explorar as transformações
do mercado de trabalho e trabalhar algumas situações de profissões específicas
como os funcionários públicos para compreender a destruição deste fator de
dinamismo da sociedade portuguesa.
Simultaneamente, a pesquisa fixa-se também na
vasta literatura de investigação que o tema está a suscitar por todo o mundo,
com relevo particular para a economia americana, filão que exige todo um
trabalho de transferência contextualizada de resultados para a economia
portuguesa e através do qual compreendemos quão débil é a investigação económica
em Portugal.
É esse o caso da invocação que alguns economistas
têm vindo a realizar dos efeitos da revolução tecnológica na destruição da
classe média, sobretudo pelo efeito conjugado sobre as remunerações do trabalho
e do volume de emprego à disposição de certos grupos de trabalhadores. O debate
das ameaças da revolução tecnológica sobre o emprego não é novo, o que parece
ser novidade é o argumento tecnológico, sobretudo o da robotização, para
explicar a destruição progressiva ou pelo menos o enfraquecimento das classes médias.
Trago hoje o tema à discussão sobretudo porque Lawrence Summers chegou ao tema e como se recordam Summers é um economista americano
peso-pesado ao qual este blogue atribui uma VOZ especial em certos temas da
contemporaneidade económica. A entrada de Summers no debate é feita de forma
direta, enunciando a tese de que a robotização da economia está a penalizar
duramente a desigualdade e sobretudo a classe média e que não serão os esforços
de investimento educacional que vão compensar esses efeitos penalizadores.
Historicamente, as revoluções tecnológicas sempre
operaram uma substituição de trabalho por capital, destruindo emprego mas
assegurando intertemporalmente a criação de novos empregos suscetíveis de
compensar a referida destruição. Mas a destruição existiu sempre e isso
penalizou sempre grupos específicos de trabalhadores.
Hoje em dia, o que estará a acontecer é que a
continuidade da revolução tecnológica, com ênfase na robotização, estará a
suscitar a procura de novas qualificações, gerando novos empregos no topo das
qualificações de ativos, mas destrói empregos mais passíveis de robotização
(automação). O que já exige uma explicação mais cabal que Summers não oferece é
a associação da tecnologia ao reforço imparável da quota de rendimento dos 1%
mais ricos. Matéria para posts seguintes.
Sem comentários:
Enviar um comentário