domingo, 2 de março de 2014

O MELHOR DO FIM-DE-SEMANA

(Eva Vazquez para o El País)


Nicolau Santos, sábado, Jornal Expresso, “O nosso modelo é o “pooreconomics”
“ (…) Nos anos 80, a política económica de desregulamentação prosseguida por Ronald Reagan ficou conhecida por Reaganomics. Na sua base existia a ideia de que mercados onde o Estado não interviesse criariam muito mais riqueza. Agora o que os senhores da Troika nos propõem é uma política que assenta na ideia redentora de que quanto mais a população empobrecer, melhor estará o país. É seguramente uma nova e genial teoria económica que deveria ser cunhada de “Poornomics”. Ou então como a máquina de fazer pobres, parafraseando Valter Hugo Mãe (…).”
Vale a pena, entretanto, analisar a que relação de forças corresponde a “poornomics” e de que forma o pensamento económico contribuiu para a sua instalação, sem pensamento alternativo a travar a sua difusão.

(…) Temos hoje muito mais informação sobre as estratégias económicas que fomentam distintas formas de crescimento sustentável e as suas consequências. A chave consiste em atribuir prioridade ao investimento relativamente ao consumo. O investimento significa fazer hoje um esforço para recolher amanhã os frutos e implica concentrar os recursos disponíveis em educação, investigação, desenvolvimento e serviços que facilitem quer uma melhor correspondência entre oferta e procura de trabalho, quer a integração da mulher no mercado de trabalho. Consumo significa dedicar uma parte do orçamento a transferências de rendimento para serem utilizadas a curto prazo. Os países que combinam níveis elevados de consumo e de investimento, como os escandinavos, geram crescimento e igualdade. Os que priorizam o investimento em relação ao consumo, como os EUA, geram crescimento à custa da igualdade. Mas os que tendem a priorizar o consumo, sobretudo se é pouco progressivo e baseado na captura do setor público por parte de interesses bem organizados, geram desigualdade e ineficiência. Itália e Espanha são dois exemplos desta última combinação letal para gerar um crescimento sustentado. (…)”
Esta parece ser também a chave para a encruzilhada em que se encontra a economia portuguesa. Os elementos disponíveis dizem-nos que o crescimento das exportações dos últimos tempos assenta em capacidade produtiva disponível que foi reencaminhada para o mercado externo, reencaminhamento esse que emerge como um forte determinante das exportações. A interrogação resulta do facto de ser necessário reforço da capacidade produtiva (ou seja novo investimento) para aguentar o ritmo conseguido de crescimento. E aí algumas interrogações persistem, o que vai exigir o início atempado de mais um ciclo de incentivos ao investimento proporcionados pelos Fundos Estruturais.

Vasco Pulido Valente, sábado, Jornal Público, “Seguro serve”


(…) Mas não acredito que alguém pudesse substituir Seguro com uma decisiva vantagem para o PS. A social-democracia acabou, apesar dos berros de meia dúzia de alucinados do PSD. Não existe social-democracia que resista à situação atual na Europa, para já não falar em Portugal. O PS acabará por se transformar, à falta de melhor, num partido de resistência à mudança e, como desde 1975 o PC, vai nos quinze anos mais próximos defender o “Estado social” e outros privilégios de uma classe média empobrecida e de trabalhadores sem força. Embora condenado e curto, este papel é um papel nobre. (…)”
Os tempos estão difíceis para contrariar o pessimismo de VPV.
José Pacheco Pereira, sábado, Jornal Público, “A Europa que nunca se debate”
“ (…) É exactamente porque o debate europeu é subvalorizado que ninguém cuida das posições dos candidatos. Paulo Rangel é o mais europeísta de qualquer candidato europeu até agora. Basta assistir às suas intervenções e ao que escreve, por exemplo no Público, para ver como ele é um crítico da própria ideia de soberania e independência, e é favorável a uma deslocação de muito do processo decisório do Parlamento português para instâncias europeias, como, aliás, está a acontecer já com o direito de veto por Bruxelas do Orçamento português no âmbito do Pacto Orçamental, ou seja, sem ser em situação de “emergência financeira”, como normalidade. Os portugueses são cuidadosamente mantidos à parte de um processo de minimização daquilo que é a função fundamental de um parlamento numa democracia, votar o Orçamento. Foi a reivindição de “no taxation with no representation” que iniciou a guerra da independência americana contra os ingleses. (…)”
Só a perspicácia de JPP para identificar a contradição que revestirá a próxima luta política interna nas próximas europeias. Os cabeças de lista Paulo Rangel e Francisco Assis são talvez os representantes mais europeístas de partidos que não se apresentam como tais ao eleitorado em matéria de desvalorização do parlamento nacional. Isto diz bem do nó cego a que fomos conduzidos.
Teresa de Sousa, domingo, jornal Público, “Somos todos sociais-democratas”
(…) Mas talvez o lado mais interessante deste fim-de-semana político seja a forma descontraída com que Pedro Passos Coelho resolver atestar a sua fidelidade à social-democracia, em tudo ou quase tudo diz respeito ao modelo social europeu. Fê-lo para responder aos seus críticos mais severos no interior do partido. Com um à-vontade um pouco irritante, na medida em que não era, claramente, essa a sua visão ideológica quando conquistou a liderança do PSD. Não se pode ser tudo ao mesmo tempo. Liberal nuns dias, social-democrata noutros, mesmo que a crise ocidental, europeia e portuguesa baralhe as convicções e as ideologias, como sempre acontece em momentos de ruptura como aquele que estamos a viver. E a verdade é que a social-democracia está ela própria numa crise tão profunda que qualquer um é livre de se reclamar dela.(…)”
As cambalhotas ideológicas de gente como Passos Coelho estão em direta correspondência ao esvaziamento de pensamento do qual a social-democracia se deixou aprisionar, sobretudo a partir do momento em que a chamada “terceira via” chegou ao poder.
Paulo Trigo Pereira, domingo, jornal Público, “Portugal não é uma folha em branco”
(…) A primeira proposta política para a saída da crise é travar a austeridade já. Se isso significar que se faz a redução do défice não com mais sacrifícios sobre os portugueses, mas antes “exportando” a austeridade, ou mutualizando a dívida, ou por via de um perdão parcial da mesma, não poderei estar mais de acordo. O problema é que, à excepção da primeira e de forma limitada, as restantes não são politicamente exequíveis. A Europa está mais perto de uma confederação do que de uma federação política, e a aversão ao programa cautelar em Portugal mostra isso mesmo. Cada país está praticamente entregue a si próprio e só em caso de emergência o BCE, com a ajuda da Comissão Europeia, vira em seu socorro. Se, pelo contrário, significar o caminho da não redução do défice então isso equivale tacitamente à escolha pela saída do euro, o que é também uma estratégia respeitável, mas que ainda não foi suficientemente estudada por ninguém. (…)
A segunda proposta política, a da folha em branco, é a que tem sido seguida pelo Governo. Abstraindo da situação real do país e da sua história, consiste numa visão apriorística do que deve ser o peso do Estado na economia para que a economia floresça. (…)”
É isto que estará em jogo nos próximos tempos. A primeira proposta exige uma construção minuciosa e uma reunião de sensibilidades que transcendem o espectro normal do PS.

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