domingo, 10 de maio de 2015

A FINANCIARIZAÇÃO DA ECONOMIA




Os economistas sabiam que uma economia de mercado não pode viver sem um sistema bancário e um sistema financeiro. Desde os tempos de Schumpeter, sabemos que o crédito assumido pelo sistema bancário pode ser encarado como uma meta-inovação que a dinâmica de inovação do capitalismo necessita e que os tempos modernos revolucionaram com a inovação do capital de risco e as suas diferentes modalidades. Os anos 90 trouxeram à economia mundial a ideia da globalização financeira e a corrente da desregulação e desregulamentação dos mercados financeiros encarregou-se de acelerar a livre circulação dos capitais, ao mesmo tempo que os mercados financeiros, à medida que se sofisticavam para além do entendimento do cidadão medianamente letrado em economia, pareciam distanciar-se das economias reais, num processo para os qual os franceses têm uma palavra que é a que em meu entender melhor se aplica, découplage da economia real e dos mercados financeiros.

Os anos 90, e particularmente o seu último terço, tudo fizeram para arrefecer o entusiasmo dos fervorosos adeptos da inovação financeira. A ruína súbita de economias asiáticas que até então eram apontadas como exemplos sagrados do capitalismo emergente e florescente foi escalpelizada e chegou-se à conclusão que os sistemas bancário e financeiro de tais economias deixavam muito a desejar e que a desregulamentação em curso abriu porta a processos de financiamento em que a avaliação de risco obedecia a um critério simples: “quem ficar que feche a porta e acarrete com as consequências”. A evidência inequívoca de que países como a Malásia que não foram em tretas e aplicaram medidas de controlo e interrupção da livre circulação de capitais foram melhor sucedidos no controlo das crises cambiais asiáticas deveria ter sido melhor compreendida. A partir daí ficou aberta a ideia de que a relação entre sistemas financeiros e desenvolvimento/crescimento era complexa do que até então tinha sido pensada. A qualidade dos sistemas financeiros interessava e por aí abria-se um mundo de contornos imprevisíveis, o que é na prática e no fundo um sistema financeiro de boa qualidade e amigável do crescimento económico. A crise de 2007-2008 nos EUA, coração da economia mundial, revelou pouco depois que afinal o rei ia mais do que nu, pavoneava-se como tal, e as instituições financeiras do centro da finança mundial eram tão frágeis como os emergentes asiáticos. A partir daí, definitivamente, o que não significa que na prática a situação tenha substancialmente mudado, a teoria económica começou a aprofundar o seu conhecimento sobre as relações entre sistema financeiro e desenvolvimento económico.

O gráfico que abre este post assinala investigações recentes acolhidas pelo FMI, cuja capacidade de aprofundamento teórico tem sido substancialmente enriquecida sob a direção de Olivier Blanchard como economista-chefe (ver aqui o estudo base).

Já aqui repetidas vezes referi que os economistas são louquinhos por curvas em U ou em U invertido, tantas e tão variadas são as tentativas de formalização de regularidades, as leis da economia, que acabam numa curva desse tipo. Ora, o que os economistas do FMI vêm concluir é que, para além do sistema de crédito ser hoje uma medida bastante imperfeita do sistema financeiro de economias emergentes, há evidências de existir um limiar para além do qual o desenvolvimento financeiro não é favorável ao crescimento económico, antes o pode prejudicar. O desenvolvimento demasiado rápido e desregulado dos sistemas financeiros é fator de instabilidade e de crises financeiras cujas consequências para a economia real são bastante perniciosas. A tese dos autores é a de que um desenvolvimento financeiro excessivo provoca a ilusão do aumento de capital mas à custa de baixos níveis de eficiência, largamente penalizadores da produtividade global dos fatores nas economias que acolhem tal sofisticação. E concluem que melhor e não necessariamente mais regulação pode conduzir a mais estabilidade e melhor retorno económico. E um novo mundo se abre: o que é uma melhor regulação dos sistemas financeiros?

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