(Não
circunscrever o debate à critica da “Mathiness”)
A relevância que atribui ao debate suscitado por Paul Romer em torno da crítica
da “mathiness”, isto é, ao modo
particular de utilização da matemática em economia que não permite o
estabelecimento de relações claras e rigorosas com categorias observáveis, não
deve ser confundida com qualquer pretensão de que tal debate esgota a
conflitualidade da economia. A investida de Romer é importante porque se
desenvolve no interior do mainstream
económico e permite-nos antever as suas próprias fragilidades, pondo em evidência
de que no seu próprio interior podem perfilar-se posições menos claras do ponto
de vista do poder das relações que reproduzem o pensamento económico na
academia. E não há dúvida de que a opção por modelizar a problemática da inovação
e da economia das ideias em ambiente de concorrência perfeita ou de concorrência
monopolista não é indiferente para a progressão da ciência económica. Romer tem
a esse nível claramente razão.
Mas o problema não se esgota nessa dicotomia. Existe um problema mais geral
que consiste em saber se o estudo da inovação e da economia das ideias como um
domínio particular através do qual a criatividade cria valor económico pode
circunscrever-se, ou mesmo se deve ser circunscrito ao mundo do equiíbrio. Com
alguma inspiração nos contributos seminais de Schumpeter e em contributos
esparsos da biologia, há um conjunto de economistas que se recusam a abordar os
processos de crescimento e da inovação (indissociáveis na sua perspetiva) através
de modelos de equilíbrio e otimização. E, ao contrário do que alguns
representantes do mainstream querem
fazer crer, a diferença entre os que pensam a economia pelas lentes do equilíbrio
e da otimização e os que a pensam em termos evolucionistas não é uma diferença
entre teoria e descrição. É antes como Nelson e Winter o explicaram também
seminalmente uma diferença entre dois tipos de teorias, uma teoria mais
formalizada com utilização do rigor analítico e simbólico da matemática e uma
teoria mais apreciativa, onde se rejeita a única de otimização para um único
equilíbrio. Ora, por mais que Romer se esforce, os contributos de Nelson e
Winter não são do foro da política. A leitura dos contributos entusiastas e
assertivos de Romer levou-me de novo à leitura de um dos textos fundamentais na
minha formação dos últimos 20 anos: Richard Nelson (1995), “Recent Evolutionary Theorizing About Economic Change”,
Journal of Economic Literature, volume XXXIII, março. Citando:
“O
conceito geral de teoria evolucionista que proponho e utilizo neste ensaio,
envolve os seguintes elementos. A atenção é focada numa variável ou conjunto
delas que muda ao alongo do tempo e a questão teórica é compreender o processo
dinâmico que subjaz a tal mudança; um caso especial consistiria em questionar o
entendimento do estado atual da variável ou do sistema em função de como
atingiu este valor. A teoria propõe que a variável ou o sistema em questão
esteja sujeito a uma variação ou perturbação aleatória e de que também existem
mecanismos que sistematicamente reduzem essa variação. Muito do poder
predictivo ou explicativo da teoria prende-se com a especificação dessas forças
de seleção. Presume-se que existem fortes tendências iniciais de inércia
preservando o que sobreviveu a partir do processo de seleção. Todavia, em
muitos casos, existem também forças que continuam a introduzir uma nova
variedade, que é matéria adicional para o processo de seleção.”
(Nelson, 1995:54)
Será isto matematizável? Há quem pense que sim, outros não. Deixará por
isso de ser teoria? Certamente que não. Mesmo que não seja matematizável,
entraremos no domínio da conflitualidade política de que fala Romer? Não me
parece.
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