Sou muito indisciplinado e por isso não sei se serei capaz de manter esta
espécie de subrubrica neste blogue, dedicada à usura do tempo nos rostos e
imagem dos que giram na órbita dos nossos afetos, fixações, fetiches, adorações,
manias ou paranoias, que iniciei com a figura de Françoise Hardy.
A segunda versão ocorreu-me hoje ao folhear o El Pais on line, cruzando-me com um artigo de Elvira Lindo sobre uma das
minhas divas, que atravessa a passadeira vermelha da inauguração do festival de
Cannes, Catherine Deneuve, 71 anos de vida, com uma afirmação surpreendente de que
a proliferação de telemóveis e câmaras digitais acabou com o que restava da
magia das estrelas. As selfies acabaramcom o glamour de outras épocas, terásentenciado Deneuve. E a jornalista acrescenta: “Mas não
são apenas as selfies que acabarão com as musas. Também estão a trabalhar para
isso os desenhadores de moda que as vestem como se fossem assistentes de um mágico
ou patinadoras, com esses brilhos apropriados apenas para quem procura distinguir-se
fazendo piruetas na pista. Contribuem também as televisões que converteram as
atrizes em agentes descarados de marcas que vestem ou de jóias que usam. E que
só se focam em rabos. O rabo com pompa de Kardashian arrasa, enche o écran e a
vista. Estou com Deneuve. Isto está a decompor-se.”
(Deneuve, no New York Times)
Não pude deixar de me fixar na imagem de Deneuve que se perfila por detrás
da minha cadeira de trabalho, no escritório, fotografada por Avedon, numa
fotografia intemporal, que preserva a Catherine da usura do tempo. E perdi-me
por alguns momentos na travessia do tempo através da transformação da Diva, que
há bem pouco foi fotografada para o New York Times, parecendo que o tempo não
passou. Pelo sim, pelo não, Avedon fixou-a para sempre e isso basta. Não
consegui registos dessa fotografia que foi retirada de uma revista de
fotografia única que circulava em França,
a Égoiste, e por isso tive de recorrer a uma outra de Avedon, mas que não é tão
intemporal como a que presencia todos os dias a natureza dolorida da minha
produção de consultor.
(Deneuve por Richard Avedon)
(Aos 18 anos nos Parapluies de Cherbourg)
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