(Distorção - Galeria de Mateus ZF Lottar Mateus)
Das três entidades que intervêm nos resgates
financeiros das economias grega, irlandesa e portuguesa, FMI, BCE e Comissão
Europeia, o FMI é aparentemente a entidade mais flexível e que tem revelado
maior (embora reduzida) flexibilidade de adaptação às situações concretas das
economias. Mas, como tem sido visível, entre as posições públicas de Madame
Lagarde e a condução das negociações observam-se por vezes desvios assinaláveis.
Isso revela que há uma crise de orientação e de mudança de paradigma de
intervenção que o desregrado comportamento de Strauss Kahn terá irremediavelmente
comprometido.
Isto não significa que não seja necessário focar
a inconsistência interna dos programas de ajustamento sob o patrocínio do FMI,
ainda que se reconheça que nos últimos vinte anos tenha havido algumas adaptações
às condições concretas das economias sob ajuda ou acompanhamento.
Mão amiga de há longa data fez-me chegar há
dias a apresentação realizada por Heiner Flassbeck, responsável pela Divisão de
Globalização e Estratégias de Desenvolvimento da UNCTAD (United Nations Conference on Trade and
Development), em 11 de Janeiro de 2012 no Bahrein (Workshop como patrocínio do Banco Central do Bahrein sobre a crise económica e financeiraglobal que aquela instituição das Nações Unidas organizou).
Alertado por aquela apresentação, consultei o
Trade and DevelopmentReport de 2011 da UNCTAD recentemente publicado, em busca do
material que terá fundamentado a intervenção do alto responsável desta
instituição internacional. E de facto encontrei material relevante que interessa
divulgar. Sobretudo porque esse material mostra que as interrogações que têm
sido colocadas aos programas de resgate financeiro não são preocupações apenas de
perigosos economistas esquerdistas. Heiner Flassbeck é apresentado no seminário
do Bahrein não apenas como responsável da UNCTAD, mas também como antigo “Deputy
Minister of Finance of Germany”. Trata-se antes de um debate sobre orientações
de política económica que atravessa já algumas instituições internacionais como
a UNCTAD.
Mas afinal de que matéria se trata? O relatório
de 2011 da UNCTAD analisa em pormenor os programas de ajustamento do FMI e
compara as previsões dos efeitos de tais programas no crescimento económico, no
défice público e na balança de transações correntes com os resultados concretos
desses programas nas mesmas variáveis. A esmagadora maioria das observações cai
no quadrante inferior à linha que consagraria igualdade plena entre previsões e
resultados. Ou seja, as previsões são sempre em média mais favoráveis do que os
resultados: crescimento inferior ao previsto, défices mais elevados do que os
esperados e melhorias inferiores às esperadas da balança de transações
correntes. Numa palavra: as lentes do ajustamento distorcem a realidade dos
seus efeitos. Recorda-se, o que não é coisa pouca, que tais
programas de ajustamento são politicamente analisados com base nas previsões e
não nos resultados.
Ora, por muito que possa ser invocada a tão
mencionada ausência de alternativas para os ajustamentos ensaiados, estas evidências
não podem deixar de influenciar o debate económico sobre a bondade deste
ajustamento. Dificilmente uma instituição como o FMI poderá ficar indiferente
ao peso das evidências.
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