segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

PEDAÇOS DE UMA NARRATIVA

Quinta-feira à noite, numa sessão de apresentação do seu livro "Um Político Assume-se" na Figueira da Foz, Mário Soares relembrou o dia em que o ex-primeiro ministro José Sócrates avançou com o pedido de ajuda externa e terá feito, a propósito, algumas “revelações”. Citando: “Falei com ele durante muito tempo, duas horas ou três, discutimos brutalmente, amigavelmente mas eu sempre a convencê-lo e ele a não estar convencido”. E, ainda: “Eu tive uma discussão com ele gravíssima” (…) “gravíssima porque eu queria que ele realmente pedisse o apoio e ele não queria (…) ele achava que podia ter feito um acordo com a Sra. Merkel antes de, mas como com o Presidente da República houve ali um grande sarilho não foi possível fazer esse acordo e depois o ministro das Finanças também interveio mais tarde e ele acabou por ter que ceder perante a evidência das coisas”.

A evidência de que fala Soares reporta-se, segundo parece de toda a razoabilidade admitir, ao período que se estendeu entre o “chumbo” do PEC 4 na Assembleia da República (23 de Março de 2011) e aquele pedido (6 de Abril), período durante o qual Sócrates terá ficado cada vez mais isolado na sua recusa – há quem diga ser curta a distância que vai do voluntarismo à teimosia… – e assim sujeito às múltiplas pressões sobre ele alegadamente ocorridas (das de Soares às dos “banqueiros” – vejam-se as declarações de Judite de Sousa referidas no meu “post” de 5 de Fevereiro –, entre outras).

Foi pelo menos isso que também inferi das afirmações recentes de Pedro Silva Pereira, quer no debate que realizou com António Pires de Lima (“TVI 24”, 10 de Fevereiro, espaço “Cara a Cara” do programa “Política Mesmo”) quer em entrevista concedida a Cristina Esteves (“RTP
Informação”) no dia 14. Designadamente: “Uma observação breve sobre aquilo que disse a propósito da situação a que se chegou em Março/Abril do ano de 2011, apenas para recordar um ponto. Porque não podemos fazer a narrativa desse processo esquecendo um facto que é um facto singular, que nunca tinha acontecido na história do euro, nem tornou a acontecer depois: houve um país, que estava sob a pressão dos mercados financeiros, que no Parlamento rejeitou um programa de estabilidade e crescimento [o PEC 4] – nunca tinha acontecido! Que tinha a assinatura de apoio do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia. Isto desencadeou uma reação – como o senhor doutor estará certamente recordado – das agências de rating e dos mercados que fez os juros disparar e os ratings baixar abruptamente, como nunca tinha acontecido, e que vieram a fechar os mercados financeiros e a gerar a situação de impossibilidade de financiamento da economia portuguesa nos mercados financeiros. Nós não podemos esquecer este facto, como se ele não tivesse acontecido, porque ele é a causa
direta do fechamento dos mercados financeiros. (…) Essa foi a causa próxima do pedido de ajuda externa.”

Ou, nos termos da peça da RTP: “Para o ex-ministro da Presidência o caminho teria sido muito diferente se, em 2011, a Oposição não tivesse chumbado o PEC 4. ‘Quem escolheu a rejeição do PEC 4, escolheu o programa de assistência financeira que nos colocou nesta situação. (…) Aquele PEC 4 significava que o BCE se dispunha a apoiar Portugal do mesmo modo que hoje está a apoiar a Espanha e a Itália.’ Pedro Silva Pereira não aceita as críticas de que o pedido de ajuda financeira foi feito tarde demais, nem mesmo quando as críticas chegam de ex-membros do Governo como Teixeira dos Santos que tinha a pasta das Finanças e Luís Amado dos Negócios Estrangeiros.”

Aqui fica o registo, para eventual memória futura, de duas peças constitutivas de um “puzzle” que ainda continua por completar

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