A esquizofrenia prossegue, sem fim à vista, neste Velho Continente. O foco das atenções está provisoriamente recentrado numa Atenas mergulhada numa tremenda crise social (acima ilustrada por Spiros Derveniotis em http://www.cartoonmovement.com) e onde se desenrolam duas negociações difíceis (e premonitórias?): por um lado, entre a troika e os representantes políticos do país no sentido de aquela viabilizar uma segunda “ajuda financeira” (estimada em 130 mil milhões de euros) e aceitar libertar uma nova “tranche” da primeira (vital em função de um compromisso de 14,4 mil milhões de euros a vencer em 20 de Março), disponibilizada aquando do resgate de 2010; por outro lado, entre os credores privados e o governo do país no sentido de aqueles aceitarem perdoar 100 mil milhões de euros de uma dívida que ascende a 350.
O já também nosso querido amigo Poul Thomsen, falando em nome da troika, veio este fim de semana esclarecer que “os salários gregos são demasiado elevados em relação à produtividade” e assim reafirmar a necessidade, entre outros, de uma diminuição do salário mínimo (dos atuais 750 euros mensais para 600), de uma baixa significativa dos salários do setor privado (entre 15 e 25%) e das pensões (35%) e de uma supressão de empregos públicos (15 mil imediatos e 150 mil até 2015). Como recentemente explicava o ex-conselheiro do primeiro-ministro Yanis Varoufakis: “Imaginemos um homem ébrio que cai ao mar. Ele é repescado, entre a vida e a morte, dão-se-lhe cobertores e um tónico. Mas eis que chega alguém e manda parar, explicando que o homem caiu à água porque estava bêbado como um cacho e que é preciso que ele compreenda que não deve voltar a beber. Recomenda, pois, que se lhe ponha gelo para o fazer reagir.”
Quanto à questão do PSI (“private sector involvment”), ela não é apenas tributária de um acordo com a troika mas depende ainda largamente de uma posição final do BCE sobre a participação do sector público ao lado do privado no corte da dívida grega – “se o BCE não contribuisse para o esforço, isso equivaleria ao absurdo de tirarmos dinheiro do nosso bolso para o metermos no dele”, referiu um dirigente de um fundo participante nas negociações. Só que o problema do BCE é real: não se trataria exclusivamente de a assunção de tal perda (estimada entre 10 e 20 mil milhões de euros) corresponder, na prática, a um reconhecimento de razão aos que consideravam como um enorme risco as suas aquisições de obrigações soberanas; seria igualmente um precedente susceptível de afetar os programas português e irlandês em curso e, sobretudo, de assustar os detentores de dívida espanhola ou italiana, causando danos de contágio não controláveis. O que explica os rumores surgidos de que estariam a ser equacionadas formas de o BCE, não participando directamente na reestruturação da dívida, se comprometer a fazer retornar à Grécia os seus ganhos futuros.
Mas parece que não é tudo! É que estarão ainda a pesar em todos estes atrasos as crescentes diferenças de abordagem que atravessam os parceiros associados na troika. Enquanto o FMI critica a Comissão Europeia por agravar a recessão com os seus excessos de austeridade orçamental e se posiciona contra o BCE defendendo a sua participação na reestruturação da dívida, o presidente do Eurogrupo Jean-Claude Juncker vem acusar o FMI de excessiva ambição em termos de recuperação da competitividade e sugerir medidas que se limitem a congelamentos de salários e alargamentos do tempo de trabalho. A crer nestes indícios, a substituição de Dominique Strauss-Kahn por Christine Lagarde poderá estar a resultar num “fecho de parêntesis” na instituição, ou seja, num novo fôlego de uma certa “linha dura” (apoiada por David Lipton e Olivier Blanchard?) apostada em regressar ao comando.
Diz-se que hoje haverá notícias…
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