terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

ESTRITAMENTE CONFIDENCIAL – A TRAGÉDIA GREGA

(by Peter Pismestrovic)


Por mais paradoxal que possa parecer, mais relevante que o acordo assinado para um segundo resgate financeiro à economia grega no montante de 130 mil milhões de euros acaba por ser o relatório estritamente confidencial preparado para a reunião dos Ministros das Finanças.
O Financial Times fala de um relatório de 10 páginas sobre a sustentabilidade da dívida grega, ao passo que a Reuters o refere como um relatório de 9 páginas. Ambos reivindicam o exclusivo de acesso ao mesmo, o que não deixa de ser curioso. Ao contrário de outras tentativas no passado, uma incursão aturada pelo Google não me presenteou com a versão do relatório, nem sequer um site que por vezes opera milagres (www.scribd.com) o disponibilizou (afinal acabou por ser disponibilizado, ver http://pt.scribd.com/doc/82248091/Greek-Sustainability-Report).
Mas o que transparece do relatório, via comentários das duas fontes que o citaram, FT e Reuters, é o reconhecimento da incompatibilidade entre os objetivos de redução da dívida e de melhoria da competitividade. Ou seja, preto no branco, os limites da chamada desvalorização interna surgem desta vez explicitados. Citando a Reuters: “O resultado será uma trajetória de dívida mais elevada, colocando-a em níveis perto dos 160% do PIB em 2020. Considerando estes riscos, o programa Grego deve por isso permanecer com o estatuto de “propenso a acidentes”, com questões de sustentabilidade a pairar sobre o programa”.
O dito relatório cita ainda medidas adicionais para viabilizar a precária meta dos 120% de dívida em relação ao PIB, através da redução de 1,5 pontos percentuais nas taxas de juro de empréstimos bilaterais no seio da zona euro e de 3,5 pontos percentuais através de uma complexa engenharia financeira de reestruturação de títulos da dívida pública grega possuídos pelos bancos centrais. Lateralmente, estas reduções provocam necessidades adicionais de recapitalização da banca para contrariar as imparidades daí resultantes. Soma-se a estas reduções a posição do BCE em abdicar das mais valias dos títulos gregos que possui, que reduzirá a dívida em 5,5 pontos percentuais adicionais.
No uso que fez do relatório, o FT fala de novo reforço da ajuda financeira à Grécia (apoio financeiro prolongado no tempo), apesar da relutância conhecida dos países AAA, Alemanha, Holanda e Finlândia.
Como processo de estabilização de expectativas nada de mais brilhante poderia estar a ser concretizado. Ou seja, qualquer uma das maratonas negociais que têm sido conseguidas abre um vasto caminho de incerteza para um horizonte de médio prazo. Resta saber se haverá consequências do reconhecimento preto no branco de que redução da dívida e melhoria da competitividade são incompatíveis, logo o reconhecimento de que a abordagem em curso à redução da dívida é “self-defeating”.
Entretanto, Münchau não é peco e escreve que se a Grécia quiser restaurar a democracia tem de assumir o incumprimento.
Mais a ocidente e perdida na blogosfera (no POLITICS.ie) uma afirmação sobre a Irlanda: “Ireland is facing 10 years of austerity. Leaving Ireland is the best thing you can do at the moment if you are responsible for a young family.” (A Irlanda enfrenta 10 anos de austeridade. Deixar a Irlanda é a melhor coisa que pode fazer se é responsável por uma família jovem), Richard Tol Former ESRI Supremo.
Para os defensores da bizarra (tema de próximo post) tese de que Portugal está a meio caminho entre a Grécia e a Irlanda esta afirmação dará para pensar duas vezes, pelo menos. Será aqui talvez que algumas vozes internas que têm apresentado a emigração como solução (incluindo responsáveis por políticas públicas que não o deveriam admitir) foram buscar a inspiração.

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