(Narayana Kochelakota, University of Rochester)
(Lars E.O. Svensson, Stockholm School of Economics))
(A recente decisão
tomada pelo FED – USA de aumentar taxas de referência e de lançar para os
mercados a ideia de uma subida gradual dessas taxas ao longo de 2016 continua a suscitar as mais sérias reservas
e a não estar refletida em indicadores de mercado)
O comportamento do FED – USA em matéria de gestão
macroeconómica tem estado sob o foco deste blogue. As razões são simples. Primeiro,
o estado de saúde da economia mundial está hoje francamente dependente da robustez
de recuperação da economia americana. Segundo, os resultados da sua intervenção
fornecem-nos elementos cruciais de informação para compreender as razões de tão
lenta recuperação após os acontecimentos de 2007-2008. Terceiro, esses mesmos
resultados também nos informam sobre a razoabilidade do diagnóstico mundial realizado
pelo FED para enquadrar tal decisão. Por outras palavras e em resumo, em torno
da decisão do FED estão em jogo questões cruciais para a avaliação do estado da
arte da macroeconomia e da sua capacidade de fundamentar a intervenção dos
bancos centrais.
Algum tempo já passado sobre a referida decisão tomada
pelo corpo executivo do FED, sucedem-se os comentários quanto à mais que provável
incapacidade da economia americana aguentar uma subida gradual da taxa de referência
de cerca de 1 ponto percentual através de quatro esperados aumentos ao longo de
2016.
Tenho seguido mais recentemente as posições de Narayana
Kocherlakota, professor de economia da Universidade de Rochester que, entre 2009
e 2015, foi presidente e CEO do Banco da Reserva Federal de Minneapolis, com
assento por essa via no FOMC do FED – USA. Como enquadramento a um pequeno post
publicado ontem por Kocherlakota (ver link aqui), é importante recordar que o
FED assumiu a decisão de aumentar gradualmente as taxas de juro de referência
no pressuposto de que, a longo prazo, os preços na economia americana evoluiriam
no sentido de se aproximarem da meta dos 2% de inflação, o valor base em função
do qual o FED guia a sua intervenção estabilizadora. Ora, como não é difícil
compreender, uma taxa de inflação desta natureza pode ser antecipada através de
alguns indicadores de mercado (taxas de juro) que procurem antecipar no tempo a
inflação projetada para o longo prazo. Entre outras modalidades para o fazer, o
sistema financeiro tem uma categoria de títulos que são indexados precisamente
em função da taxa de inflação que se antecipa a 10 anos. É aquilo a que
Kocherlakota chama instrumentos de mercado de compensação da taxa de inflação a
longo prazo. Seguindo com atenção essas taxas de compensação da inflação a
longo prazo acabamos por ter uma via indireta para antecipar o modo como o mercado
está a antecipar essa inflação.
Ora, Kocherlakota chama a atenção, e creio que o faz com
pertinência, para o facto dessas taxas estarem numa tendência sistemática para
a baixa, já desde 2004 e não há quaisquer sinais que tenham reagido em sentido
contrário após o FED ter reafirmado a sua ideia de que a taxa de inflação se
aproximará desse referencial. Vários economistas têm sublinhado a insuficiência
que resulta do FED encarar a meta dos 2% mais como um teto do que uma meta – referencial.
Se a perspetiva for de meta-referencial então teriam de admitir-se períodos de crescimento
dos preços acima dos 2% para em média proporcionar uma taxa de inflação de
longo prazo de 2%. Perspetiva totalmente contrária resultará dos 2% serem
entendidos como um teto.
Face à permanente descida das taxas de compensação da
inflação a longo prazo, Kocherlakota identifica uma de duas situações: ou
existe (algo que ele considera ser uma relação teoricamente pouco fundamentada)
uma relação transitória e misteriosa entre o comportamento desses títulos
indexados à inflação de longo prazo e a descida dos preços do petróleo ou então
o que o mercado estará a dizer de forma clara é que não acredita na capacidade
do FED influenciar a taxa de inflação a longo prazo. As consequências para a
gestão macroeconómica da segunda destas possibilidades são extremamente gravosas.
A credibilidade do FED e da política monetária estarão em risco sério. Num contexto
problemático dessa natureza, teimar em aumentar as taxas de juro de referência
com as expectativas de inflação a longo prazo a não reagirem à política do FED
significará tornar a recuperação menos robusta. Kocherlakota não hesita em considerar
que o FED deverá rever o mais depressa possível a sua decisão.
Lawrence Summers vai no mesmo sentido numa entrevista ao Bloomberg. É taxativo na sua afirmação de que a economia não aguentar quatro
esperadas subidas da taxa de referência.
A mais representativa evidência de que a política monetária
pode ser precocemente restritiva e assim minar toda uma recuperação é dada pelo
cada vez mais estudado erro de política monetária praticado pelo Banco Central
da Suécia quando entre junho/julho de 2010 e julho de 2011 aumentou a taxa de
juro de referência de 0,25% para 2%. O Professor Lars E.O. Svensson da
Universidade de Estocolmo, então no Banco Central e que foi um dos grandes
adversários dessa precipitada decisão, tem desenvolvido um trabalho sistemático
de denúncia desse erro. Sabe do que fala e tem mostrado que não foi por falta de informação na altura que esse erro foi cometido.
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