(Alessandro Gatto – “Window”, http://www.cartoonvirtualmuseum.org)
O antecipado “Expresso” desta semana, que ontem li na incomparável calma desse dia primeiro, integrava três apontamentos opinativos que merecem atenção e registo. No primeiro caderno, Pedro Santos Guerreiro assinava “Os socialistas estão entre nós” e escrevia, nomeadamente: “A decisão do Banco de Portugal é má mas é acertada. É acertada porque a alternativa era serem os contribuintes a sofrer mais perdas. Porque o prejuízo estava lá, faltava quem o assumisse. Assumiram os credores, à força. Privados. Quase todos estrangeiros. Quase todos grandes investidores financeiros. São os mercados. O que não se percebe é porque, sendo assim, não o foi antes, logo na resolução do BES, em 2014. Nem se percebe porque é que os obrigacionistas do Novo Banco perderam e os do Banif não.” Ou ainda: “Mas, sendo a menos má das más, a decisão tem um custo que é superior à má fama que semeamos. O risco do país aumentou. Menos investirão em Portugal. Ou pedirão mais dinheiro por isso.”
Na primeira página do caderno de Economia, Manuela Ferreira Leite falava-nos de “A Queda de uma Ministra” e escrevia, designadamente: “Quase não consigo acreditar na notícia de que o governador do Banco de Portugal alertou a ministra das Finanças para o que poderia vir a acontecer ao Banif e esta lhe respondeu de forma ‘dura’ por não aceitar quaisquer perdas para os contribuintes. Como não a considero incompetente, concluo que colocou a defesa do seu prestígio pessoal acima do interesse nacional e dos cidadãos. Lamentável!”
Por fim, a “Revista” abria como habitualmente com a “Pluma Caprichosa” de Clara Ferreira Alves e um inspirado texto intitulado “A Camarilha”. Que começava assim: “Existe em Portugal uma camarilha que há décadas roça o Rosa & Teixeira pelos bancos das administrações e que usa o título pomposo de ‘sistema financeiro’. A camarilha fez o que quis, entrou e saiu dos governos, financiou partidos e amigos nos partidos e estabeleceu uma rede de influências e proteções políticas e jurídicas que a tornou impune e imune. Se fosse elaborado um diagrama destes nomes, verificaríamos como eles passam de um banco para outro, de uma instituição para outra, de um conselho de administração para outro, de uma pasta para outra, de uma sinecura para outra. Verificaríamos que existe um padrão de repetição de nomes e cargos, um padrão de filiações e cumplicidades, um padrão de atitudes e decisões. Alguns destes fundaram bancos e modernizaram a banca portuguesa, outros foram donos disto tudo e durante anos glorificados por jornalistas e analistas, até serem atirados para a sarjeta e culpados disto tudo. Estes tubarões, pelo menos, contribuíram para a economia portuguesa e, com ilícitos penais à mistura e abusos de poder, criaram riqueza. São as cabeças deles que aparecem no cepo mas não são eles os autores da destruição do sistema financeiro. Esses são os políticos e politiqueiros que eles recrutaram e que abancaram no regime, são os empresários ligados ao ventilador do Estado, são os empregados dos partidos, são os ministros desempregados, são os confidentes dos reis, são as legiões de assessores e advogados e conselheiros, são os argutos analistas que nunca repararam em nada e que almoçam com eles. São as rémoras que têm as ventosas cravadas no dorso dos tubarões e que se deixam transportar e alimentar dos restos que lhes caem da boca. Chama-se a isto, na natureza, comensalismo. A este ‘comensalismo’ chamamos, na ditosa pátria, sistema financeiro.”
Três peças que põem de modo brilhante a nu o triste “Isto” que é este Portugal a que deslizantemente chegamos. E a que, dê lá por onde der e doa a quem doer, temos de saber dar a volta sob pena de uma definitiva irrelevância ou pior...
(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)
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