domingo, 3 de janeiro de 2016

A ANSIEDADE GLOBALIZADA




(A expressão vem de Gideon Rachman do Financial Times, mas descreve bem o estado do mundo globalizado no despertar de 2016)

Gideon Rachman, analista internacional do Financial Times, acabou o ano de 2015 com uma crónica que ilustra bem o mundo que vamos ter em 2016. Escolhi a ideia de “um mundo que não se recomenda” como um dos temas do ano de 2015, e a expressão da “ansiedade globalizada” cunhada por Rachman ajusta-se como uma luva ao que nos espera neste ano que desperta.

Sabemos que a economia mundial não está propriamente atomizada. Ela organiza-se em torno de um conjunto de poderes, em número relativamente reduzido, os quais estruturam por sua vez as respetivas áreas de influência. Não é claro hoje qual a estrutura de influência que marca a trajetória das economias emergentes. Mas, regra geral, há sempre um ou dois dos poderes estruturantes que apresem perspetivas económicas e políticas mais animadoras. Essa regra também nos elucida que quando isso se verifica a turbulência mundial não chega a traduzir-se por grandes recessões.

A crónica de Rachman chamava a atenção para o facto de, contra a normalidade, hoje ser difícil identificar um foco de poder que a interação do económico e do político produza um horizonte confiável e esperançoso. No seio da economia mundial, talvez caiba aos EUA compensar a perda de energia de todo o mundo económico, a começar pelos emergentes que vivem momento de elevada incerteza. Não raras vezes, como o caso do Brasil assim o ilustra, essa perda de energia vem associada a questões escabrosas no plano político, anunciando por essa via fracas perspetivas de geração de maiorias com capacidade de “pegar o touro pelos cornos”. Rachman vai ao ponto de afirmar que a principal força de incerteza na economia mundial é hoje política, embora possamos avançar que parte dessa incerteza advém de performances económicas pouco saudáveis. A economia mundial continua a conviver mal com os radicalismos religiosos, em vias de descontrolo absoluto e, em muitas paragens, em combustão rápida alimentada pela deterioração dos preços do petróleo e com ela a fragilização da base económica que aguentava toda a delapidação de excedente em que tais regimes estão baseados.

Os EUA são do ponto de vista político uma grande incerteza, embora no plano económico tudo indica que tenderão a ser a força que vai aguentar a debilidade dos restantes poderes estruturantes da economia mundial. E, mesmo do ponto de vista económico, o debate da estagnação secular na economia americana mostra que as coisas podem não estar seguras. No plano político, na próxima eleição presidencial estarão em jogo vários posicionamentos possíveis para os EUA no mundo e isso não será indiferente ao ambiente de “ansiedade globalizada”.

Do Japão e da União Europeia pouco haverá de esperar. No primeiro caso, fazem-se figas para que o ciclo já longo de deflação e dívida possa ser vencido, esperando que do ponto de vista político o relacionamento com a China tenha pelo menos alguma estabilidade. Na Europa, as convulsões internas continuam tais que seria pretensioso admitir que, mesmo que ponderando a sua dimensão económica, possa daí esperar-se alguma influência motora para a economia mundial.

Ansiedade globalizada: uma oportunidade para o universo dos ansiolíticos.

Sem comentários:

Enviar um comentário