sábado, 2 de janeiro de 2016

ASIEH AMINI




(Haveria muitas formas de começar o ano neste blogue, mas reconhecer a coragem e as lições do ativismo feminino em sociedades como a iraniana é um excelente começo)

Optei pelo lado emocional para começar o ano de 2016. Não sei o que isso significa. Tão só provavelmente uma coincidência de registos face a notícias marcantes.


Poderia começar, por exemplo, com o concerto de Ano Novo com a Filarmónica de Viena a ser dirigida, e pelos registos de modo espetacular (registo do El Mundo, aqui), pelo maestro letão Mariss Jansons. Não sei bem explicar a minha fixação por este evento. As minhas inclinações seriam naturalmente mais concretizadas com um acontecimento de raiz mais popular, colocando a música ao serviço de públicos mais vastos, do que propriamente aquele, provavelmente snob, elitista, mas que sei eu da sociedade austríaca? Mas aquele evento e a grandiosidade imperial daquela sala atraem-me para além e contra todas as convicções ideológicas. O concerto de Ano Novo em Viena e um espetáculo que fosse no Festival de Salzburgo seriam duas coisas que gostaria de fazer antes de desaparecer deste mundo. Ficam os discos e os vídeos.



Outra hipótese seria colocar aqui em realce o recente e memorável You make me feel …” de Aretha Franklin no Kennedy Center Honours de 2015, com um Obama comovido e a família Obama a explodir de regozijo. No vídeo, que se recomenda, é espantoso sentir o confronto entre a força avassaladora de Aretha e a presença algo histérica de uma loura que não consegui identificar.


Mas a minha fixação para hoje resulta de uma passagem de leitor acidental e despreocupado pela edição digital da New Yorker de 4 de janeiro de 2016, que continuo a assinar religiosamente, pois há luxos snobs e elitistas que são aditivos e a New Yorker é-o já há muito tempo. O rosto poderoso que abre este post e que abre também uma peça de investigação jornalística de grande nível de Laura Secor é de uma mulher iraniana, proveniente de uma família relativamente abastada do Norte do Irão, nas montanhas Elburz, Asieh Amini. A peça é toda uma homenagem à coragem e determinação de uma ativista que lutou e luta a partir do exterior contra práticas penais no Irão, de teor moralista sobre a vida sexual de jovens, que implicam execuções e apedrejamentos. Poeta e jornalista, Asieh Amini entrou nos domínios perigosos do ativismo a partir da sua experiência de estudo do jornalismo na universidade Allameh Tabataba’i em Teerão. A partir da sua licenciatura, foi tomando consciência progressiva dos fenómenos sobre os quais passou a ser uma determinada ativista, escrevendo em vários jornais, desde inicialmente os jornais controlados pelo poder religioso até a publicações de teor mais alternativo e sempre sujeitos a uma rigorosa vigilância por parte do poder religioso. O artigo descreve a evolução da ativista e do seu marido, fotógrafo, Montazeri, ao longo das diferentes fases do regime iraniano, desde a erupção da revolução islâmica até ao presente, passando pelos sucessivos momentos de abertura e de retrocesso, até à sua fixação como escritora em risco na sempre aberta Noruega, em Trondheim.

A transição de sociedades como a iraniana não sabemos ainda para que modelos, suscetíveis de proporcionar alguma interlocução com o mundo civilizado, ou tendendo para um corte irreversível com o ocidente, estará, o tempo irá reconhecê-lo, indissociavelmente ligada à coragem e determinação de ativismos.

A força intrínseca do rosto de Asieh Amini e as cores espantosas da capa que a envolve são um símbolo da determinação que a abordagem a 2016 irá exigir. Com ativismo ou no mais modesto dos posicionamentos sociais, não importa.

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