(A vida é feita de
paradoxos, o desaparecimento
de Almeida Santos, um homem de pontes e consensos, acontece quando as
presidenciais tendem a fraturar a rosa)
Confesso que redijo este post depois de uma ligeira incursão pelo debate presidencial a nove
na RTP1, ao mesmo tempo que testemunhava a queda da arrogância leonina em Portimão.
A minha perceção é a de que vivemos um paradoxo: desaparece Almeida Santos, um
vulto controverso da democracia portuguesa, mas uma personalidade forte da
construção do sistema democrático e da descolonização, alguém que fez pontes e
consensos no PS, e as presidenciais têm nos últimos dias agudizado a guerra das
rosas (para roubar uma expressão ao Observador.
Não sei, como alguns jornalistas o parecem sugerir, que
António Costa ganhará com qualquer um dos resultados mais prováveis das eleições
presidenciais. Não me parece que com o resultado mais provável, a vitória de
Marcelo à primeira volta, a recente descoberta por parte de Marcelo das
vantagens de aumentar o consumo interno, em simultâneo com o reforço das exportações,
constitua uma vantagem assim tão nítida para Costa. É verdade que com a sua
posição de não hostilização do governo e até de compreensão para com as suas
dificuldades Costa terá ganho algum fôlego para aguentar os próximos meses,
incluindo a dura discussão do orçamento de 2016 fora e dentro do país. Mas,
embora compreenda a empatia e afetividade que Marcelo desperta na população, cansada
da rigidez intragável de Cavaco, não poria as minhas mãos no fogo pela estabilidade
das posições de Marcelo.
O que eu sei é que estando o PS necessitado de alguma
estabilidade interna para ir avaliando as incidências do acordo parlamentar e decidir
que governação assumir à medida que eventuais dificuldades nesse acordo venham
a emergir (se não surgissem algum mistério teria que ser explicado), a
abordagem às presidenciais não pode dizer-se que seja exemplar para assegurar
essa estabilidade. A candidatura de Maria de Belém corresponde não, como a cândida
candidata o apresenta, a um gesto de pura cidadania. Ela tem implícita a perceção
que sempre grassou entre algumas hostes socialistas de que isto de independentes
é só para abrilhantar alguns saraus, sábios para uns que se contactam antes das
eleições e não para concorrer com a voracidade da máquina partidária. Tenho muita
pena de dizer isto mas os nomes que mais pontificam na candidatura de Belém
poderão ter representado muito no PS mas pouco têm para oferecer ao seu futuro.
Por isso, a fratura cavada entre o apoio ao candidato
independente e o que é dirigido à personalidade de dentro é tudo o que o PS
necessitaria para navegar nos tempos que correm. Não entendo por isso que raio
de benefício Costa pode retirar desta situação e gostaria de saber que razões
mais profundas levam históricos como Alberto Martins, Vera Jardim e Manuel
Alegre a consumirem-se com a criatura Belém. Mas a vida tem corrido mal à cândida
candidata. Essa perda de energia culminou hoje com a questão das subvenções
vitalícias aos políticos (o princípio da confiança defendido pelo
Constitucional manda e não o podemos aceitar quando nos convém e rejeitá-lo
quando nos desagrada. Ficaria bem a Belém assumir que integrou o grupo de deputados
que solicitou a sua constitucionalidade e não esconder-se por detrás da
desculpa que não tinha lido o acórdão do Constitucional. Afinal Belém está
atenta às questões constitucionais, esperemos que não apenas as que resultam em
seu próprio benefício.
Quanto a Marcelo, o que dizer. Vejo-me contristado a
reconhecer que a melhor peça jornalística sobre tão complexa personalidade é a
de Maria João Avillez no Observador. Nem sempre o que este digital on line publica se recomenda. Mas a peça
sobre Marcelo talvez faça hesitar muita gente na confiança que está atribuir à
sua candidatura.
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