(O ritual mantém-se
e a minha mesa de voto é bem a imagem de um país de velhos numa eleição presidencial sensaborona, que só
António Nóvoa quis no fundo agitar)
Escrevo sem qualquer intuição do resultado que vamos ter,
com a consciência tranquila de ter apoiado e votado num candidato que foi o único
a querer de facto dignificar este ato eleitoral, herdando uma comunicação
social hostil que parece ter virado apenas nos últimos dia.
Tivemos de facto umas eleições sensaboronas, com a
esmagadora maioria dos candidatos convictos de que não seriam Presidentes da
República. António Nóvoa foi de facto o único a apresentar um vislumbre de
alternativa de vitória ao Marcelo dos afetos (sinceros? Não sei o que dizer!). Todos
os outros candidatos para além de Nóvoa e Marcelo queriam outras coisas que não
apresentar-se como alternativas. Tinham outros recados e mensagens para dar,
menos para se apresentar como alternativas reais à Presidência.
E se nestas eleições houve alguma coisa de interesse foi
a evolução do ponto de vista dominante da comunicação social. De início,
jornais e televisões começaram como se de um plebiscito de Marcelo se tratasse,
desde a vergonhosa despedida de Marcelo da TVI até ao lançamento das primeiras
candidaturas. Por tabela, António Nóvoa começou proscrito, visto como o
personagem da retórica e do discurso redondo, vindo do vazio da política quando
tanto se critica a sua estreita captação de novas personalidades, o enjeitado
pelo PS, como se o seu epitáfio eleitoral estivesse preparado. Depois, a comunicação
social farejou prazenteira o aparecimento da cândida Belém, afinal era uma espécie
de cisma do PS que se preparava. E já que o Professor Marcelo não fazia o jeito
aos que queriam tirar desforço das eleições de 4 de outubro, a cândida Belém vinha
a calhar, afinal seria o tema da campanha. Os restantes candidatos tinham pouca
chama e Marisa já era conhecida, pelo que tudo se concentrou no fazer de conta
de Marcelo e na agressividade de Belém. Mas esta, apesar de apoiada por algumas
personagens históricas do PS, sempre incomodados com os independentes e com a
sua imprevisibilidade, depressa mostrou ao que vinha e que não tinha pedalada
para mais altos voos. A queda de Belém foi a comunicação social que a precipitou,
tal como o facto político da sua candidatura tinha sido por ela preparado.
Sampaio da Nóvoa teve razão em recear que a queda de Belém
beneficiasse mais Marcelo do que ele próprio e não sei se não terá razão. Os
apoiantes de Belém são suficientemente teimosos para não darem a mão à palmatória
e preferirem votar Marcelo do que em Nóvoa. Nunca o saberemos.
E assim tivemos uma eleição estranha, sem candidato
aparente de direita e sem uma mobilização de esquerda para uma candidatura com
afirmação crescente. Mas também uma eleição que se realiza num momento em que os
cidadãos estão mais focados na sustentabilidade do governo de Costa e das suas
opções. Afinal, os “amigos do alheio” do costume, externos com os seus representantes
internos, estão aí a dizer que estamos cá, não nos ignorem, pois temos muita
força e o vosso endividamento coloca-vos na vulnerabilidade.
Sampaio da Nóvoa merecia a oportunidade de uma segunda
volta que nos poderia trazer o verdadeiro Marcelo. Não estou tão otimista como
isso. Gostaria de ser surpreendido.
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