(Não lembraria ao careca que o presidente da Assembleia-Geral da Liga Profissional de Futebol aparecesse envolvido numa atividade inspetiva do SEF, que parece assim resistir galhardamente à sua extinção, dirigida à academia futebolística BSports e que, tudo o indica, ocultava graves situações de tráfico de jovens, sequestro e privações de liberdade a troco de uns cobres e de fartas promessas de ascensão ao estrelato. O que verdadeiramente me espanta é que uma iniciativa localizada no coração do Ave, logo com um estilo de povoamento em que a disseminação e contágio de informação acontecem como a disseminação de um incêndio em circunstâncias climáticas anormais, nada tivesse transpirado sobre os aspetos mais recônditos e menos recomendáveis de uma academia, pelos vistos internacionalizada, e cujos vídeos de apresentação soam agora a imagens repugnantes da mais pura hipocrisia. O Ave habituou-nos no passado a circunstâncias desta natureza que julgávamos de vez banidas, até porque o território é hoje fonte de dinâmicas incontornáveis de inovação e afirmação internacional. Que tenha sido o futebol a viabilizar esse indesejável regresso ao passado não me espanta, já que ele continua a representar em Portugal uma fonte inesgotável de desvirtuamento da lei e de acolhimento dos interesses mais inconfessáveis.)
Os números não enganam. A formação de jovens para o futebol atingiu em Portugal uma qualidade e desempenho notáveis, de que a diáspora dos nossos mais talentosos futebolistas constitui a evidência mais segura. As academias desportivas dos grandes (Benfica, Porto e Sporting) e dos médios (Famalicão, por exemplo) do futebol atingiram um nível superior de profissionalismo e há que creditar estas academias com um papel inequívoco de integração social de jovens que, sem esse apoio, estariam hoje provavelmente em trajetórias de exclusão.
Abaixo desse nível de formação, existe todo um universo de escolinhas do futebol que, em regime de franchising reproduzem a nível local a formação dos grandes clubes. O meu neto Francisco quando frequentava uma dessas escolinhas do SLB, participou numa reunião conjunta no Estádio da Luz de todos esses exemplos de franchisings que deu para perceber a dimensão do fenómeno e sobretudo o seu nível de organização.
O caso da BSports parece ser um caso à parte desse universo, orientada de origem para a captação de jovens por todo o mundo, acenando-lhes com a qualidade da formação em Portugal e a possibilidade de em simultâneo lhes assegurar uma qualificação escolar mínima.
Tal como consta dos livros, qualquer população migrante tem graus de vulnerabilidade enormes e, nessa linha, uma linha ténue existe entre a integração social mais avançada e os exemplos mais degradantes de exploração da vulnerabilidade humana.
Pelas notícias divulgadas, a BSports terá enveredado por esta última modalidade, a coberto de um organismo poderoso como a presidência da Assembleia-Geral Liga de Clubes e do ar enfatuado de Mário Costa. Mais um artista português do universo de personagens que deveriam ser estudados em profundidade e que povoam a miríade de personagens que se passeiam por este palco.
Só espero que a atividade inspetiva do SEF tenha ido suficientemente fundo para colocar toda esta gente no seu devido lugar, atrás das grades, sem contemplações. E que a sociedade do Ave reflita profundamente sobre esta matéria – como foi possível escapar-lhe esta deriva da formação de jovens para o futebol.
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