O ruído em torno da eventual ida de António Costa para um cargo europeu tornou-se uma constante cíclica na sociedade portuguesa destes anos recentes. Uma matéria que chega a assumir contornos quase esquizofrénicos por parte dos nossos órgãos de comunicação social, mas relativamente à qual o Presidente da República e a Oposição (quase toda ela, apenas com BE e PCP a serem razoavelmente comedidos) não cessam de lançar achas de todo o tipo e quase sempre despropositadas pelas suas caraterísticas de mau gosto, especulação ou antecipação no tempo.
Veja-se o nosso principal e mais respeitável diário, o “Público” (infografias abaixo): (i) Sexta-Feira 23, uma notícia de destaque dominante em primeira página a remeter para uma peça assinada por Ana Sá Lopes intitulada “Bruxelas vai pressionar Costa a ir para o Conselho Europeu”, onde se refere também que “a ideia de que António Costa não vai escapar a um futuro europeu pós-2024 já domina os bastidores em Bruxelas” e que “a hipótese de Costa vir a substituir Josep Borrell como alto representante da UE não deve ser totalmente excluída”; (ii) Segunda-Feira 26, uma chamada de primeira página (“Não aceitarei missão que ponha em causa a estabilidade em Portugal”) a remeter para uma peça assinada por São José Almeida que transforma aquela afirmação do primeiro-ministro numa declaração algo distinta e segundo a qual “António Costa não está disponível para cargos europeus”.
Mais uma vez, cá temos Portugal a ser lançado na discussão de uma não-questão. Porque é claro que Costa goza de um significativo prestígio em Bruxelas e nas capitais europeias, como é claro que se esforça por alimentar esse capital em nome dos interesses do País mas também dos próprios (Órban que o diga!). Porque é ainda claro que os grandes cargos europeus se conquistam com muita tática (sobretudo quando se tem origem num país da periferia) e que desta fazem parte o silêncio como alma do negócio e algum bluff para forçar o apetite dos grandes decisores. Porque é finalmente claro que uma boa probabilidade de sucesso depende de fatores exógenos que só podem ser acompanhados e minimizados (a correr bem) e da forma como for evoluindo a situação política interna e o mood associado (presidente, partido e sucessão, oposições, sondagens, eleições europeias e calendários eleitorais, etc.).
António Costa sabe que a sua margem de manobra não é enorme, que a paciência é fulcral e que qualquer erro ou precipitação equivaleria à “morte do artista”, razão pela qual procura gerir o processo com o devido cuidado (necessariamente assim tendo de incluir algum défice de transparência) e sem ânsias visíveis. No entanto, António Costa sabe também que a maioria dos portugueses que olham para estes temas não desconhece que, se e quando a oportunidade lhe passar por perto, não pensará duas vezes e não hesitará um segundo em a aproveitar ― a bem do País e de uma desejável alternância no poder, segundo alguns, ou para mal de um País sem alternativa capaz e consequente, segundo outros. O que for soará e, a meu ver, nenhum mal virá ao mundo, à Europa ou a Portugal do que quer que venha a ser esse futuro que haverá de chegar...
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