(Pablo Garcia, http://www.sabado.pt)
Tenho uma enormíssima veneração pelo papel histórico que o PCP desempenhou ao longo de grande parte do século XX português. Tenho um profundo respeito pela devotada entrega à causa de tantos dos seus responsáveis que por ela arriscaram vidas e sacrificaram vivências. Tenho um grande, embora desconfiado, fascínio pelas normas que regem a organização comunista e a sua militância, assim como bastante simpatia pela forma notável como naquela se vai inteligentemente fazendo a formação de quadros e a renovação de lugares. Tenho um significativo apreço pela dedicação e seriedade da maioria dos autarcas eleitos sob a bandeira da CDU. E tenho mesmo alguma simpatia por algumas das suas atuais caras mais representativas, a começar pelo líder Jerónimo de Sousa e por alguns deputados e ex-deputados à Assembleia da República.
Feita esta espécie de “declaração de interesses”, não direi nada de muito novo se disser que o PCP é hoje mais um problema do que uma solução para Portugal. É certo que os comunistas e as instituições que controlam – CGTP à cabeça – continuam a constituir um exemplo de persistência e confiabilidade no mar encapelado de atropelos e “navegações à vista” em que a sociedade portuguesa se vai transformando. Mas quando aqueles atributos geram insistências de tal modo teimosas que redundam em rigidezes sem saída, não caberá questionar o primado da sobrevivência da máquina e das cliques que ela vai reproduzindo – e as cópias vão sempre tendendo a ser, naturalmente e com honrosas exceções, piores do que os originais... – em detrimento da procura de uma resposta minimamente aplicável aos problemas nacionais?
Vem isto a propósito de João Ferreira, aquele jovem de ar “bonitão” mas já com quase vinte anos de militância – afinal um ortodoxo de discurso arrogante e nem sempre qualificado – com que o PCP se voltou a apresentar às eleições europeias. Porque foi realmente com algum agrado que ouvi Marinho e Pinto, no último “Prós & Contras”, dirigir-lhe muito justamente a seguinte denúncia: “Porque nós não podemos ter discursos – a aqui eu dou razão à Dra. Ana Gomes –, ter discursos denunciando a convergência nas votações entre o PS e o PSD e, depois, partidos de esquerda votarem com a extrema-direita no Parlamento Europeu. E nós não podemos tolerar isso (...) e aqui mesmo em Portugal o Bloco de Esquerda e a CDU votaram com o PSD e o CDS para rejeitar um plano de ajuda da União Europeia que tinha medidas de austeridade mas infinitamente menos dolorosas do que aquelas que vieram. E, portanto, há responsabilidades históricas que todos têm que assumir. Eu gostava de ver essa explicação ao povo português. Porque eu, sendo de esquerda, quando vejo uma pessoa de extrema-direita ao meu lado, a votar comigo, eu penso sempre que sou eu que estou errado, que não é o da extrema-direita. Têm que analisar e dar essa explicação. Porque há de facto interesses partidários que se sobrepõem, nesta lógica, ao interesse nacional.”
De facto, não vou ao ponto daquele amigo meu que defende a tese de que Portugal estará sempre bloqueado enquanto tiver uma população com 50% de benfiquistas e entre 20 a 25% de votantes à esquerda do PS. Mas lá que é deprimente a análise do essencial das propostas do PCP em vigor, lá isso é! Com derivadas e graves implicações no registo de prestações como aquela de Rui Sá – quando trocou os princípios por um prato de lentilhas servido pelo amigo Rio na Câmara Municipal do Porto – ou a dos últimos e pouco honrosos anos de presença no Parlamento Europeu. Porque dá até para admitir que, com gente desta a mandar – gente nova por fora e irremediavelmente envelhecida por dentro –, talvez o Dr. Mário Soares nunca tivesse chegado a ser Presidente da República contando com a preciosa ajuda dos sais de frutos tomados e dos sapos engolidos pelo camarada Álvaro Cunhal...
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