sábado, 7 de junho de 2014

CARO ANTÓNIO, NÃO CHEGA



Com esta invenção de António José Seguro de protelar por quatro meses, com férias de permeio, a decisão incontornável de clarificar os destinos do PS, protelamento que, ou muito me engano, vai colocar a alternativa numa espécie de “segue dentro de momentos”, tudo pode ser antecipado nesta matéria. É tempo suficiente para o manobrismo partidário atuar no que verdadeiramente gosta de fazer, seja para plantar trincheiras defensivas, seja para cavar pontos de ligação com o cheiro do vencedor antecipado. Mas é também tempo suficiente para António Costa falar mais para fora do que para dentro.
Nunca esperei que a apresentação das bases programáticas no Porto constituísse um momento de rara inovação de ideias e de convencimento de que está ali uma alternativa de governação. Por isso, as minhas expectativas eram à partida limitadas. Mas mesmo com um padrão de expectativas limitadas, soube-me a pouco, soube-me a pouco. Os portugueses estão fartos de bases programáticas que não adiantam coisa nenhuma ao nosso futuro governável e cujo grau de não cumprimento é vergonhoso. Estão também fartos de ideias “wishful thinking” provenientes de intelectuais esforçados que se reúnem de vez em quando e que pensam que para tudo há uma medida de política pública, pensando que a governação é uma máquina que dispara medida e produz efeito. Ora a declaração de ontem no Porto acrescenta pouco ao que AJS tem vindo a soletrar com o mesmo tom de voz as medidas mais importantes e cruciais e as que destinam a compor um programa. Por isso, um acomodado João Proença, que deve ter preparado bem o seu futuro com AJS se apressou a vir a terreiro a proclamar que a apresentação de Costa foi um tiro falhado e não se enganou muito.
Nas condições em que esta candidatura aparece os Portugueses não precisam de apresentações de bases programáticas, precisam sim de respostas concretas às dúvidas que o bom senso alimenta quanto ao futuro:

  • Que posição defende AC em relação à gestão da dívida e ao pacto orçamental?

  • Qual é o seu modelo de Europa para o qual se propõe trabalhar com o seu peso político e encontrando alianças, não sei bem onde, mas por exemplo nos resultados de Matteo Renzi em Itália?

  • Que dinâmica de aplicação se propõe atribuir aos Fundos Estruturais 2014-2020, sobretudo no contexto em que o governo atual parece não saber encontrar uma resposta às fortes reações adversas que a Comissão Europeia terá apresentado ao Acordo apresentado em 31 de janeiro de 2014 e que podem comprometer opções dos PO já apresentados para discussão em Bruxelas: Poiares Maduro precisa de uma crítica contundente pois até agora os resultados da sua ação coordenadora são de uma pobreza bem franciscana;

  • Que princípios básicos tem em mente (simples e reduzidos em número) para propor uma reforma de Estado e nesse âmbito definir a consolidação orçamental?

  • Que mercado de trabalho (flexibilidade e segurança) pretende colocar à discussão da Concertação Social e que papel pretende atribuir-lhe?

  • Que forças políticas à sua esquerda e que sensibilidades de opinião e personalidades à sua direita pretende estimular para uma governação não exclusivamente baseada nas forças PS?

  • Que recursos públicos está disposto a conceder à investigação científica de excelência internacionalmente reconhecida que não apresenta um potencial de rápida disseminação para o tecido empresarial e que por isso pode não ser financiável pelos Fundos Estruturais 2014-2020?

  • Que três ou quatro ideias apresenta para a criação de um ambiente de crescimento mais intenso da economia portuguesa?

Como é óbvio, a resposta definitiva a parte destas questões exigirá a seu tempo decisões sobre as escolhas públicas orçamentais que devem ser concretizadas para as materializar. Para isso haverá tempo e ocasiões mais convenientes. Por agora, precisamos de respostas concretas e menos ideias redondas. Para ideias redondas já temos ATS e pelos vistos os portugueses não estão satisfeitos com isso. E um conselho simples: para isso não se rodeie de intelectuais especializados no wishful thinking construído a partir de um centro do mundo que é Lisboa. Faça jus à sua imagem de homem pragmático habituado a decidir, teimoso quanto baste naquilo que acredite e por isso rodeie-se de gente que conheça os meandros da governação e já agora de um bom constitucionalista que estude bem a jurisprudência constitucional mais recente. Extirpe também de uma vez só os piu-piu Maçães e companhia que pululam por aí e que também no PS os haverá, por certo.

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