A mediatização extrema a que a trajetória de Cristiano
Ronaldo foi submetida pelo mundo que rodeia a sua carreira torna-o híper vulnerável
e aos coletivos em que se integra. Assim, nunca talvez uma deceção futebolística
portuguesa teve tanta projeção como a nossa saída “limpinha” dos oitavos e a
justificação para tal está no complexo mediático e de interesses em que a
carreira de Cristiano está construída.
A crónica de Santiago Boncagliolo, hoje no El País,
é bem ilustrativa dos ódios e amores que a personalidade de Cristiano tem
suscitado em Espanha, neste caso, construindo uma metáfora narcísica sobre os
diferentes penteados que o próprio foi apresentando ao longo da copa. Um
excerto delicioso:
“(…) A mitologia grega conta que Narciso, um jovem que tinha
desprezado o amor dos outros, se enamorou de si mesmo ao ver a sua imagem
refletida num rio. Ficou tão impressionado que quis acercar-se para beijar a
sua imagem. E ao fazê-lo caiu à água e afogou-se. A ameaça de Cristiano Ronaldo
está no espelho. E quando se afoga arrasta com ele toda uma equipa.”
Por mero circunstancialismo, enquanto lia esta crónica
na edição em papel do El País revia
na SIC Notícias o Expresso da Meia-Noite de ontem sobre o BES e seus derivados.
Não pude deixar de estabelecer a correspondência entre a queda narcísica
(presume-se que temporária) de Cristiano e a desagregação do BES, da família e
de toda a economia que gira em torno daquela matriz. A sensação desagradável de
que uma parte do País está rota tem paralelo na perceção de que tivemos de que
das 32 seleções da Copa provavelmente a portuguesa era a que estava fisicamente
pior preparada, já não falando nos já célebres “índices mais elevados de suspeição lesional” (bravo Dr. Jones!) da
seleção. Argutamente, Cristina Ferreira, jornalista do Público, salientou
repetidas vezes no programa o incompreensível silêncio das forças políticas
para com o problema do BES já vindo a público há bastante tempo. É mais um
sinal severo de que muita coisa está rota e corrompida. E já agora não deixa de
ser irónico que seja um governo PSD-CDS a demarcar-se da concessão de crédito
possível (via CGD e BCP) ao BES para remediar desvarios. Se fosse acionista da
PT estaria preocupado com a pipa de massa de financiamento de curto prazo que a
PT pelos vistos enterrou na situação. Cheira a desagregação. Face a isto a
queda narcísica de Cristiano é uma gota de água.
Sem comentários:
Enviar um comentário