De acordo com os resultados mais visíveis, as
desproporcionadas políticas de austeridade e contenção fiscal geradas pela tola
ideia de que a crise europeia é tão só uma crise de dívida geraram perdas de
produto e de emprego a curto prazo desnecessárias, o que bastaria para
penalizar os seus responsáveis. Por muito que se pretenda branquear essa perda
de curto prazo, e Portugal é um caso claríssimo dessa tentativa despudorada de
branqueamento, a perda está lá, é mensurável, as suas consequências nefastas
sobre as famílias não podem ser ocultadas e isso bastaria para que António José
Seguro se interrogasse por que razão não foi capaz de capitalizar esse
descontentamento.
Mas, à medida que os dados do pós-crise 2007-2008
e pós políticas de austeridade são trabalhados mais profundamente, vai sendo
possível demonstrar que os danos provocados por ideias tão insensatas não se
reduzem às perdas de produto e de emprego a curto prazo. Os economistas
americanos foram os primeiros a alertar para essa possibilidade, com Bradford
DeLong à cabeça, chamando a atenção para as perdas massivas de produto potencial
que as desproporcionadas políticas de contenção fiscal estariam a provocar. O
mecanismo é conhecido e alicerça-se sobretudo na diminuição do produto potencial
máximo que as economias podem alcançar. A principal causa prende-se com o
mercado de trabalho e com os ativos que se transformam precocemente em inativos
e não regressam ao mercado de trabalho, diminuindo assim o produto máximo
potencial que seria possível obter com os recursos disponíveis. Em termos económicos,
esse fenómeno chama-se hysteresis e
está modelizado por alguns economistas como Bradford DeLong e Summers, no
artigo seminal sobre o tema.
O gráfico de autoria de Krugman que abre este
post e que invoca um recente e importante artigo de Larry Ball demonstra-o
cabalmente evidenciando que as economias que realizaram os maiores ganhos de
excedente estrutural orçamental (por força da contenção fiscal
desproporcionada) são as que apresentam os declínios percentuais mais elevados
de produto potencial. Estima-se que 1% de perda de produto gerada por políticas
de austeridade reduz o produto potencial de 1%, o que assinala uma política
económica fortemente destrutiva a longo prazo. No artigo que escrevi para a
Organização Internacional do Trabalho com a colega Pilar González chamámos a
estes efeitos de longo prazo de efeitos perversos dinâmicos, que não se reduzem
ao produto potencial. Nesse artigo, mostrámos que os efeitos sobre os
investimentos das famílias em capital humano integram também essa dinâmica de
efeitos perversos. Por felicidade, vamos conseguir publicar uma versão desse
trabalho na revista italiana Economia&Lavoro da Fondazione Giacomo Brodolini, o que constituirá uma pequena compensação para que estas ideias
fluam com mais nitidez.
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