terça-feira, 15 de setembro de 2015

A DECEÇÃO EUROPEIA




(A degenerescência anunciada do projeto europeu)

Aquilo que vai passando à frente dos nossos olhos, uma espécie de contraponto entre o desespero dos que fogem à destruição pela destruição ou ao ruir de equilíbrios sustentados por projetos ditatoriais e a incompetência e cinismo das lideranças europeias (aqui neste caso com a devida vénia à exceção da senhora Merkel), tem-me provocado a perceção de algo que era antecipável. Basta para isso projetar retrospetivamente a nossa atenção no passado recente da incapacidade europeia para ser VOZ no mundo de hoje. Tal qual barata tonta ou fingindo simplesmente tratar-se de questões lá bem nos mundos mais lonqínquos, não tão longínquos como uma rápida análise de um Atlas qualquer nos poderia esclarecer, a Europa foi- se desligando de qualquer intervenção ativa na geopolítica mundial como bloco, seja na Líbia, Síria ou outro qualquer ponto em ebulição.

Nesta minha reflexão, não é tanto a progressiva emergência dos nacionalismos e projetos populistas na velha Europa que me interessa sublinhar. É tão generalizada essa perceção que não vale a pena insistir sobre essa matéria. Mesmo os populismos mais retrógrados vão mais tarde ou mais cedo tomar consciência de que o futuro de sobrevivência da Europa passa por influxos demográficos e nos próximos tempos não serão seguramente europeus os que podem assegurar essa dinâmica. A minha reflexão vai para os recém-chegados do leste europeu. O pensamento europeu desligou-se também de tentar compreender quão perversas poderiam ser as transições para a democracia concretizadas a partir do desmantelamento nessas sociedades das estruturas do velho comunismo de planificação central. Nos meus tempos universitários do fim dos anos 60 e década de 70 de passagem pelo marxismo, as sociedades de transição eram um tema de culto, já alimentado por um marxismo mais eclético e aberto a outras correntes. A transição nestas sociedades foi simplesmente escamoteada, pelo simples facto que elas representavam a vinda para o lado de cá de quem tinha estado no lado oposto. Condescendência, tentativa de disseminação à força da economia de mercado, invocação afetiva das virtualidades de sociedades resistentes à tirania, perceção de sociedades que trataram a transformação à lupa das margens de manobra possíveis, tudo contou para não se dedicar a reflexão necessária ao tipo de sociedades que emergiriam a partir da derrocada das velhas estruturas comunistas. A progressiva evolução do jogo político democrático em alguns destes países e sobretudo as inúmeras degenerescências que aqui e ali foram emergindo no complexo espectro político destes países foram progressivamente olhadas com indiferença.

A indecente posição dos países do leste europeu, com a Hungria à cabeça e seguidores potenciais em linha como a Eslováquia, não pode deixar de ser compreendida à luz dessa transição que ninguém quis aprofundar. O que prova bem a insensatez com que os diretórios foram pensando a questão europeia e os sucessivos alargamentos. Talvez fruto de uma lógica de mercado único que tende a prevalecer sobre tudo, estaremos por isso à beira dos desmoronamento puro e simples de um projeto quando por mais paradoxal que seja se sucedem os muros no seu interior.

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