(Joep Bertrams, http://www.caglecartoons.com)
O “La Repubblica” de hoje dá conta do seu acesso a um documento confidencial mas proveniente de fontes credíveis muito próximas do governo que explicita os principais contornos da trattativa que está em curso entre as autoridades transalpinas e a Comissão Europeia a propósito do orçamento italiano para 2016.
A coisa é simples de explicar: o compromisso que inicialmente tina sido assumido era o de um défice de 1,8% do PIB; no ano transato, a “nova flexibilidade” autorizada por Juncker, Moscovici e seus pares proporcionou um fechar de olhos a mais 0,4% de despesa (em torno de 7 mil milhões de euros) numa base trianual; a estratégia agora em desenvolvimento passa por somar outro tanto àquela flexibilidade (“obter um novo desconto” é a rigorosa terminologia utilizada!), o que tenderia a levar o défice para um valor aproximado de 2,6% do PIB. O racional da Itália nesta negociação parece assentar em três componentes do lado da despesa (0,1% atribuíveis a reformas estruturais em implementação, que são no mínimo duvidosas; 0,1% relacionadas com investimentos que o país é obrigado a realizar por imposições europeias, os quais não são todavia facilmente vislumbráveis; 0,2% designadas por “políticas” e que ficam assim no completo segredo dos deuses) e três correspondentes aplicações do lado da receita (abolição do imposto imobiliário sobre a primeira casa, aumento de pensões e uns retoques no imposto sobre as sociedades).
Sendo que o mais relevante de toda esta embrulhada é o que ela evidencia quanto ao funcionamento europeu. Isto é, de uma Europa onde as regras são ditas para cumprir, mas cuja exigência de cumprimento e verificação é variável consoante o interlocutor. No caso vertente, o resplandecente charme das italianas e dos italianos (como, aliás, também das francesas e dos franceses) vai-lhes permitindo a obtenção de “descontos” que clara e gradualmente os afastam dos objetivos, ditos inalienáveis e inegociáveis, do chamado Tratado Orçamental (fiscal compact). No final das contas, e como há sempre males que vêm por bem, o que começa tendencialmente a resultar, mesmo que “à má fila”, é que o dito Tratado perde significado e efetividade e com isso a fazer também abrandar o intolerável garrote que ele impunha a alguns países – uma boa notícia para um próximo governo português liderado por António Costa, já que a desgraça de uma continuidade Passos/Portas talvez levasse aquele a posicionar-se no sentido de ir além da flexibilidade, insistindo em cumprir, contra tudo e todos, a apostólica missão que consciencializou por encomenda expressa dos mercados...
(http://www.repubblica.it e cartoons de Emilio
Giannelli, http://www.corriere.it)
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