(Notas sobre
o paper que Ricardo Reis, não o regresso de Pessoa, mas o economista da Columbia
University, apresentou no Brookings Panel on Economic Activity)
Ricardo Reis é talvez o economista português
que presentemente tem maior prestígio internacional, sobretudo a partir do
momento em que ingressou nos quadros da Columbia University, também colaborando
com a London School of Economics. O ainda jovem economista que cedo saiu de
Leça da Palmeira em Matosinhos para se projetar primeiro na sua formação
superior e depois na investigação e numa carreira universitária nos EUA não é
um economista qualquer, sendo por isso relevante a sua visão do ajustamento
aplicado na economia portuguesa.
O Brookings Panel in Economic
Activity é, regra geral, um espaço de grande visibilidade de debate de
ideias, reunindo economistas de grande notoriedade. Ricardo Reis apresentou, na
semana passada, nesse evento, uma espécie de update de um longo artigo por si publicado na Primavera de 2013 no Brookings Papers on Economic Activity que
a Brookings Institution edita
regularmente e alargando o trabalho que apresentou, em Lisboa, na Conferência
da Gulbenkian em 2014, onde se focou na questão da dívida pública.
Reis tem razão em considerar que, dado o fracasso generalizadamente
reconhecido do ajustamento aplicado na Grécia, e considerando que os
ajustamentos na Irlanda e em Espanha resultam de problemas do setor bancário,
Portugal é a única matéria-prima que as instituições da Troika poderiam
apresentar como salvando a face das políticas de ajustamento. Nesse sentido, são
conhecidos os esforços do próprio FMI e do ministro das Finanças alemão Schäuble
para eleger a experiência do ajustamento português como um caso de sucesso.
A posição de Reis não alinha pelo mesmo entusiasmo do FMI ou de Schäuble. Ele
divide e bem os resultados do processo de ajustamento em dois domínios: a
alteração das condições de acesso ao financiamento internacional em termos de
taxas de juro, incluindo o alongamento que foi possível introduzir às
maturidades da dívida pública e a criação de condições favoráveis ao
crescimento económico. No primeiro caso, Reis reconhece que a probabilidade de
réplica de uma crise similar à ocorrida em 2010/2011 é muito mais baixa,
podendo desse ponto de vista o programa de ajustamento ser considerado positivo.
Reis não desenvolve suficientemente o enquadramento favorável proporcionado
pela intervenção do BCE e o acolhimento favorável que a Troika concedeu ao
aumento de maturidades da dívida. Em relação aos critérios da criação de condições
favoráveis ao crescimento, Reis é mais contido e não cobre completamente a cantilena
de que o ajustamento colocou a economia portuguesa na rampa do crescimento económico.
Aponta para isso alguns dados inequívocos: (i) a dívida pública a continuar a
representar uma percentagem muito elevada em relação ao PIB; (ii) o facto da dívida
do setor empresarial não ter descido como aconteceu em Espanha em que desceu 20
pontos percentuais; (iii) o crescimento dos créditos de cobrança duvidosa
ameaça a robustez da banca nacional. Entre as transformações que terão ocorrido
e que Reis considera do seu ponto de vista favorável estão: (i) a putativa
maior flexibilidade do mercado de trabalho conseguida sobretudo na maior
disseminação de contratos a termo; (ii) no aumento de produtividade de setores
não transacionáveis como o comércio por grosso e retalho e o imobiliário na
sequência da realocação de recursos dos não transacionáveis para os transacionáveis
e que pode contrariar a apreciação da taxa de câmbio real e (iii) o aumento dos
níveis de qualificação do emprego.
Dos aspetos positivos mencionados por Reis convém ter presente os
conhecidos problemas de medida da produtividade nos não transacionáveis, por
isso é necessário ter em conta que só em períodos mais longos é possível credibilizar
os aumentos de produtividade de que fala Reis.
Reis não considera na sua apreciação os custos sociais do processo de
ajustamento e com isso fica limitado na avaliação das condições do putativo êxito
do ajustamento. Mas as suas observações aos efeitos do ajustamento sobre as
condições de crescimento económico da economia portuguesa merecem ponderação,
pois quaisquer que sejam os resultados de 4 de outubro são questões com as
quais vamos ter de nos preocupar.
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