(Os restos
do banquete da PT)
No Quadratura do Círculo que marca a rentrée política, houve uma discussão
lamentavelmente curta travada sobretudo entre António Lobo Xavier (ALX) e
Pacheco Pereira (PP) sobre o que a atual maioria teria conseguido em matéria de
retirar dos corredores do poder uma parte considerável dos poderosos da economia,
com Jorge Coelho compreensivelmente mudo e calado sobre a questão. ALX era particularmente
vivo na apresentação dessa limpeza como uma grande vitória da maioria, o que
também é cristalinamente compreensível já que como advogado tinha visto os seus
clientes (particularmente o grupo SONAE) ultrapassados por grupos empresariais
então mais próximos do poder de Sócrates. A esta argumentação de ALX
contrapunha PP a ideia de que a atual maioria teria também os seus amigos de
proximidade, até porque nestas matérias e salvo raras exceções os grupos
empresariais têm uma conceção do poder bastante abstrata, independentemente das
convicções que o fundamentam e suportam. Poder é poder e o que interessa é
manter a proximidade. A alternância só interessa a essa lógica de ganho de
influência se o poder estabelecido por qualquer motivo se afastar e bloquear
algumas das suas pretensões ou grandes objetivos.
Uma análise mais fina mostra, entretanto, que o estrondo da queda dos que
giravam na proximidade do poder de Sócrates é superior à emergência dos novos
amigos do poder da maioria e isso poder gerar a ideia falsa de que a atual
maioria é mais equidistante das forças económicas do que o último governo do
PS. É que com a fragilidade da estrutura empresarial portuguesa, o estrondo da
queda dos poderosos com o BES e a PT entrelaçados na tragédia acaba por ocupar
um espaço difícil de preencher e leva necessariamente tempo a recompor em
termos de proximidade representativa face ao poder. Tenho a ideia de que em
torno da atual maioria gira uma poderosa teia de escritórios de advogados e de
consultoras de negócios globais que exerce uma influência mais difusa e menos
concentrada do que a que era exercida junto da entourage mais próxima do
governo de Sócrates. E essa poderosa teia andou nos últimos tempos fortemente
ocupada e envolvida nos grandes negócios das privatizações, afinal um espantoso
mundo de oportunidades para esse tipo de influência no meio empresarial.
Não deixa de merecer reflexão atenta o facto da governação socialista
anterior se ter deixado enredar na teia das fragilidades da PT e do BES, talvez
na ilusão de que a PT iria protagonizar a formação de uma empresa nacional
verdadeiramente global. Está por fazer toda essa história. A experiência mostra
que quando qualquer governação se serve de grupos empresariais determinados
para concretizar opções de política económica global, que podem até ser louváveis,
como por exemplo construir empresas globais, normalmente dá com os burros na água
e mais tarde ou mais tarde surgem as cumplicidades.
Este fim-de-semana com a história do chumbo provável da Comissão Europeia
ao apoio do sistema de incentivos à criação do Centro de Dados da Covilhã,
ainda todos se recordam inaugurado perante o entusiasmo mediático de Zeinal
Bava, é de matéria debaixo do tapete que pode falar-se, sobretudo num projeto
onde não se vislumbra qualquer potencial dele estruturar alguma faixa do
sistema de pequenas e médias empresas nacionais em matéria de TIC. Demoraremos
ainda algum tempo a compreender toda a série de cumplicidades que a ligação
BES-PT teceu. Elas ficarão na história de mais uma tentativa gorada de
estruturar o sistema produtivo nacional à margem do seu sistema de PME
fortemente exportadoras.
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