domingo, 6 de setembro de 2015

OS AMIGOS DO PODER




(Os restos do banquete da PT)

No Quadratura do Círculo que marca a rentrée política, houve uma discussão lamentavelmente curta travada sobretudo entre António Lobo Xavier (ALX) e Pacheco Pereira (PP) sobre o que a atual maioria teria conseguido em matéria de retirar dos corredores do poder uma parte considerável dos poderosos da economia, com Jorge Coelho compreensivelmente mudo e calado sobre a questão. ALX era particularmente vivo na apresentação dessa limpeza como uma grande vitória da maioria, o que também é cristalinamente compreensível já que como advogado tinha visto os seus clientes (particularmente o grupo SONAE) ultrapassados por grupos empresariais então mais próximos do poder de Sócrates. A esta argumentação de ALX contrapunha PP a ideia de que a atual maioria teria também os seus amigos de proximidade, até porque nestas matérias e salvo raras exceções os grupos empresariais têm uma conceção do poder bastante abstrata, independentemente das convicções que o fundamentam e suportam. Poder é poder e o que interessa é manter a proximidade. A alternância só interessa a essa lógica de ganho de influência se o poder estabelecido por qualquer motivo se afastar e bloquear algumas das suas pretensões ou grandes objetivos.

Uma análise mais fina mostra, entretanto, que o estrondo da queda dos que giravam na proximidade do poder de Sócrates é superior à emergência dos novos amigos do poder da maioria e isso poder gerar a ideia falsa de que a atual maioria é mais equidistante das forças económicas do que o último governo do PS. É que com a fragilidade da estrutura empresarial portuguesa, o estrondo da queda dos poderosos com o BES e a PT entrelaçados na tragédia acaba por ocupar um espaço difícil de preencher e leva necessariamente tempo a recompor em termos de proximidade representativa face ao poder. Tenho a ideia de que em torno da atual maioria gira uma poderosa teia de escritórios de advogados e de consultoras de negócios globais que exerce uma influência mais difusa e menos concentrada do que a que era exercida junto da entourage mais próxima do governo de Sócrates. E essa poderosa teia andou nos últimos tempos fortemente ocupada e envolvida nos grandes negócios das privatizações, afinal um espantoso mundo de oportunidades para esse tipo de influência no meio empresarial.

Não deixa de merecer reflexão atenta o facto da governação socialista anterior se ter deixado enredar na teia das fragilidades da PT e do BES, talvez na ilusão de que a PT iria protagonizar a formação de uma empresa nacional verdadeiramente global. Está por fazer toda essa história. A experiência mostra que quando qualquer governação se serve de grupos empresariais determinados para concretizar opções de política económica global, que podem até ser louváveis, como por exemplo construir empresas globais, normalmente dá com os burros na água e mais tarde ou mais tarde surgem as cumplicidades.

Este fim-de-semana com a história do chumbo provável da Comissão Europeia ao apoio do sistema de incentivos à criação do Centro de Dados da Covilhã, ainda todos se recordam inaugurado perante o entusiasmo mediático de Zeinal Bava, é de matéria debaixo do tapete que pode falar-se, sobretudo num projeto onde não se vislumbra qualquer potencial dele estruturar alguma faixa do sistema de pequenas e médias empresas nacionais em matéria de TIC. Demoraremos ainda algum tempo a compreender toda a série de cumplicidades que a ligação BES-PT teceu. Elas ficarão na história de mais uma tentativa gorada de estruturar o sistema produtivo nacional à margem do seu sistema de PME fortemente exportadoras.

Sem comentários:

Enviar um comentário