quarta-feira, 16 de julho de 2014

DESIGUALDADE: NOVOS DESENVOLVIMENTOS



Sérgio Aníbal, jornalista do Público assina hoje um artigo em torno de dados de um estudo proveniente do BCE no qual se comparam dados de desigualdade entre diferentes países, medida pela quota de riqueza do 1% mais rico das populações em confronto.
Portugal emerge neste estudo como um dos países mais desiguais nesta perspetiva, com esse 1% mais rico a apropriar 25% da riqueza nacional.
A publicação de informação sobre os stocks de capital e de riqueza em Portugal é extremamente deficitária, sendo praticamente dominante a existência de informação em matéria de fluxos, ou seja medindo a desigualdade pela distribuição do rendimento e não da riqueza.
Como o amplo e renhido debate em torno da obra de Piketty, O Capital no Século XXI, veio mostrar a desigualdade quando medida simultaneamente por indicadores de stock e de fluxos adquire um outro significado, sobretudo do ponto de vista dos fatores que explicarão a sua evolução ao longo do tema. É de facto sugestivo analisar o comportamento do rácio Capital-rendimento, até porque há várias formas elegantes do ponto de vista quantitativo de o fazer. Pelo que tenho lido, a versão de Bradford DeLong é a mais elaborada e não deixa por isso de ser fácil de apreender.
O comportamento dinâmico do rácio Capital /Rendimento é influenciado por taxas de crescimento que afetam o denominador e o numerador. Começo pelo denominador porque corresponde às taxas mais divulgadas. Numa versão simples, o denominador (rendimento) cresce à taxa de crescimento da economia, por sua vez igual à soma da taxa a que cresce a população e da taxa a que cresce a produtividade do fator trabalho, ambas influenciadas por diferentes fatores. O comportamento dinâmico do numerador é um pouco mais complexo, já que depende de três taxas: a taxa de lucro a que o capital é remunerado, a taxa a que esse capital é acumulado (fruto do investimento realizado a partir dos lucros globais) e a taxa a que a que riqueza (capital) se deprecia. Tal como DeLong assinala (link aqui e aqui), tendo em conta que a taxa de depreciação da riqueza não tem grandes flutuações, o comportamento dinâmico do capital será essencialmente determinado pela diferença entre a taxa de lucro e a taxa de acumulação da riqueza.
Este esquema analítico muito simples permite mostrar que nas últimas décadas as taxas que influenciam o denominador têm-se mostrado bem menos pujantes do que as que influenciam o numerador. Por exemplo, no quadro do modelo de crescimento focado nos não transacionáveis em Portugal (infraestruturas, imobiliário, financeiro), é líquido que num contexto que gerou anemia de crescimento as taxas de lucro e de acumulação da riqueza foram superiores ao crescimento da força de trabalho e da produtividade do mesmo.
A inexistência de informação estatística regular e fiável sobre a distribuição da riqueza impede por exemplo de testar qual é, por exemplo, o peso dos referidos 1% no total da dívida externa portuguesa e no total de dívida interna privada. Talvez tivéssemos algumas surpresas ou talvez não. Mas não dá para adivinhar.

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