Sérgio Aníbal, jornalista do Público assina hoje
um artigo em torno de dados de um estudo proveniente do BCE no qual se comparam
dados de desigualdade entre diferentes países, medida pela quota de riqueza do
1% mais rico das populações em confronto.
Portugal emerge neste estudo como um dos países
mais desiguais nesta perspetiva, com esse 1% mais rico a apropriar 25% da
riqueza nacional.
A publicação de informação sobre os stocks de
capital e de riqueza em Portugal é extremamente deficitária, sendo praticamente
dominante a existência de informação em matéria de fluxos, ou seja medindo a
desigualdade pela distribuição do rendimento e não da riqueza.
Como o amplo e renhido debate em torno da obra de
Piketty, O Capital no Século XXI, veio mostrar a desigualdade quando medida
simultaneamente por indicadores de stock e de fluxos adquire um outro
significado, sobretudo do ponto de vista dos fatores que explicarão a sua
evolução ao longo do tema. É de facto sugestivo analisar o comportamento do
rácio Capital-rendimento, até porque há várias formas elegantes do ponto de
vista quantitativo de o fazer. Pelo que tenho lido, a versão de Bradford DeLong
é a mais elaborada e não deixa por isso de ser fácil de apreender.
O comportamento dinâmico do rácio Capital /Rendimento é
influenciado por taxas de crescimento que afetam o denominador e o numerador.
Começo pelo denominador porque corresponde às taxas mais divulgadas. Numa
versão simples, o denominador (rendimento) cresce à taxa de crescimento da
economia, por sua vez igual à soma da taxa a que cresce a população e da taxa a
que cresce a produtividade do fator trabalho, ambas influenciadas por
diferentes fatores. O comportamento dinâmico do numerador é um pouco mais
complexo, já que depende de três taxas: a taxa de lucro a que o capital é
remunerado, a taxa a que esse capital é acumulado (fruto do investimento
realizado a partir dos lucros globais) e a taxa a que a que riqueza (capital)
se deprecia. Tal como DeLong assinala (link aqui e aqui), tendo em conta que a taxa de depreciação
da riqueza não tem grandes flutuações, o comportamento dinâmico do capital será
essencialmente determinado pela diferença entre a taxa de lucro e a taxa de
acumulação da riqueza.
Este esquema analítico muito simples permite
mostrar que nas últimas décadas as taxas que influenciam o denominador têm-se
mostrado bem menos pujantes do que as que influenciam o numerador. Por exemplo,
no quadro do modelo de crescimento focado nos não transacionáveis em Portugal
(infraestruturas, imobiliário, financeiro), é líquido que num contexto que
gerou anemia de crescimento as taxas de lucro e de acumulação da riqueza foram
superiores ao crescimento da força de trabalho e da produtividade do mesmo.
A inexistência de informação estatística regular
e fiável sobre a distribuição da riqueza impede por exemplo de testar qual é,
por exemplo, o peso dos referidos 1% no total da dívida externa portuguesa e no
total de dívida interna privada. Talvez tivéssemos algumas surpresas ou talvez
não. Mas não dá para adivinhar.
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