Tratava-se de uma crónica anunciada. Quando
assisti às primeiras imagens do desmoronamento do então poder na Ucrânia e se
começou a perceber que toda a série de grupos, organizações e seitas paramilitares
ocupavam a cena (nesse caso a praça, há sempre uma praça) em simultâneo com a
celebração espontânea da liberdade temi o pior. Depois, olhando a divisão do país
em zonas de influência ucraniana e russa e recordando a história, percebi que
era uma questão de tempo para perceber a emergência desse pior. O começo do
separatismo pró-russo e a posição ambígua da Rússia à medida que o ocidente
começava a apertar a pressão sobre o Kremlin fizeram-me perceber que se iria
entrar numa guerra descontrolada. Pois, mesmo que os separatistas pró-russos
tenham o apoio militar e de equipamento (o que parece evidente) por parte da Rússia,
todas as contradições do regime soviético atual (as várias Rússias que se movimentam
na era Putin) vão projetar-se irremediavelmente na imprevisibilidade das forças
separatistas.
Não pensei que essa crónica anunciada se
manifestasse tão cedo. E a imprevisibilidade das forças separatistas é compatível
quer com a tese do engano (alvejar um avião civil pressupondo que era militar),
quer com a tese da pura barbárie, ou seja alvejar esse avião admitindo que
poderia ser um avião civil. A primeira é provavelmente a mais realista, pois desconhece-se
se as forças separatistas terão tecnologia que lhe permita reconhecer aquela
altitude o alvo em causa.
Aquela parte do mundo está perigosa. A moral da
história é que a decomposição destes mundos gera aquilo que chamo a guerra
descontrolada. Com esta imprevisibilidade e com movimentos desta natureza à sua
sorte e arbítrio será mais sensato não voar por aquelas zonas.
P.S. O live blog que o Financial Times dedicou ao abate do MH17 é documento precioso para acompanhar a evolução do processo. No
meio desse material, esta imagem do tráfego aéreo em tempo real no mundo e
sobre aquela zona em particular dá para pensar sobre as grandes alterações
deste mundo.
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