A chegada de Matteo Renzi à Presidência rotativa
da União Europeia não pode dizer-se que tenha acontecido numa sucessão calma e
longe da pressão mediática. Vitaminado pela sua votação nas últimas eleições
europeias, Renzi apareceu a falar grosso, primeiro com o seu discurso
arrebatado no Parlamento Europeu onde se atirou pura e simplesmente ao líder
alemão dos Populares Europeus e, ontem, numa diatribe contra o até aqui intocável
Jens Weidman, governador do Bundesbank e relativamente próximo de Merkel. Perante
um embasbacado Barroso, Renzi acusou Weidman de ingerência nos assuntos
internos italianos, denunciando a entrada em domínios que não pertencem aos
banqueiros mas às instituições políticas nacionais.
Temos assim uma entrada de Renzi brigão, cuja
força será tanto mais ouvida e respeitada quanto mais fizer avançar o seu plano
de reforma da Itália, numa tentativa de quebrar a conhecida inércia italiana à
mudança.
Não é que não seja saudável ouvir alguém a bater
o pé à demasiado consentida e interiorizada hegemonia alemã. Mas os interesses
de uma EU mais equilibrada e com maior capacidade para aplicar flexivelmente os
tratados em função da situação de défice de crescimento económico europeu não
podem limitar-se ao regozijo com uma Presidência menos dócil e mais rebelde. Para
além de um Renzi brigão, precisamos de um Renzi hábil negociador, colocando na
mesa as verdadeiras questões e mostrando que é coerente com o que consegue
dentro (Itália) e o que defende fora (UE).
E conviria que não se transformasse numa espécie
de salvador da esquerda europeia, designadamente na Europa do Sul. A fé em S.
Hollande rapidamente se desvaneceu, pois o homem revelou-se incapaz dos
milagres que lhe eram pedidos. Uma coisa é apoiar uma voz de referência, com capacidade
de VOZ e sobretudo de aglutinar interesses europeus mais desprotegidos e menos
ouvidos. Outra coisa bem diferente será uma perspetiva salvífica, que procure
artificialmente ocultar as incapacidades e responsabilidades dessas esquerdas. Seis
meses de uma Presidência podem ser preciosos para marcar uma presença e iniciar
uma outra presença da Europa do sul na perversa construção europeia.
Intuição
minha, ou também neste dossier António
José Seguro foi apanhado no momento errado e nas companhias erradas. Apostou
praticamente tudo na esperança Hollande e saiu chamuscado. Aparentemente, o
brigão e de voz grossa Renzi tenderá a apreciar um estilo mais forte do que o
de AJS. Mas essa é a questão menos importante. A questão principal é a de saber
se, com o estilo brigão ou com uma presença negocial mais forte, Renzi consegue
alterar o equilíbrio de forças da discussão política no Conselho e com isso dar
também alguma alma e margem de manobra ao Parlamento Europeu.
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