sexta-feira, 25 de julho de 2014

PARA ALÉM DA QUEDA



Num ápice, todas as principais peças do Grupo Espírito Santo (GES) pediram regime de proteção de credores, o que significa a derrocada de todo um grupo, pretensamente considerado um baluarte do desenvolvimento económico português (de que modelo de desenvolvimento?). E persiste no ar um ambiente de suspeição de que por detrás desta derrocada outras pontas do regime democrático podem mostrar-se na sua nudez inconveniente e indecorosa. Esse ambiente de suspeição está presente por exemplo no aparecimento em público tão meloso (como é o personagem) de Eurico Brilhante Dias, o qual a coberto do Facebook vem clamar com a questão “E se Ricardo Salgado conta o que sabe?”. O que é que a alforreca Brilhante Dias quererá dizer com essa suspeição? Pretenderá que Ricardo Salgado precipite com ele outras cumplicidades (iria jurar que Dias estaria a pensar na corte de Sócrates), quem sabe?
O irritante Joaquim Aguiar tem desta vez plena razão ao sublinhar que a queda do GES e as novas condições de supervisão europeia (BCE oblige…) da banca vem reequacionar as condições do financiamento privado e das suas formas de interação com o financiamento público da economia portuguesa, podendo representar uma espécie de partir do zero.
A tese dos centros de decisão nacional está tão rota como o estão as condições financeiras dos principais grupos empresariais portugueses. As privatizações feitas à pressa e concluídas mesmo antes de existir lei orientadora representam tudo menos investimento estrangeiro potencialmente estruturante para a economia portuguesa no domínio dos transacionáveis. Os grupos que restam, sobretudo os da área da distribuição, não são estruturantes de coisa nenhuma. A sua internacionalização pode ajudar a complicar a distinção entre transacionáveis e não transacionáveis mas daí a contribuir para um modelo de inovação e crescimento prenunciador de um perfil de especialização para a economia portuguesa vai um passo de gigante. Os exemplos empresariais bem-sucedidos na área dos sistemas de informação e “software houses” estarão sempre na corda bamba da aquisição por capital internacional ou da subcontratação com gigantes do software internacional como a Microsoft, Cysco e outras. Falta-lhes massa crítica de entorno empresarial para resistir à venda ou à vulnerabilidade da subcontratação.
Se a minha intuição está certa, não ignorando que a AutoEuropa e o que ela significa continua a existir, ficaremos de novo restringidos ao nosso sistema de PME, inovadoras e internacionalizadas. Com o ambiente de privatizações que alimentámos, já não acredito que a atração de Investimento Direto Estrangeiro (IDE) efetivamente estruturante atinja os níveis desejados.
Fica pelo menos a certeza de que se nos resta o referido sistema de PME então será necessário ajustar os instrumentos de política pública a essa realidade. A iniciativa que a Gulbenkian realizou no passado dia 22 de julho no Círculo Universitário do Porto dedicada à apresentação do projeto Noroeste, construído em torno dos ecossistemas de inovação das universidades do Minho, Porto e Aveiro (no qual as férias me impediram de estar presente) aponta para a direção certa.

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