sábado, 21 de abril de 2012

EPISTEMOLOGIAS DO SUL



A imagem do monumento que Óscar Niemeyer dedicou ao Movimento dos sem Terra é escolhida pelo sítio da Tate Modern em Londres para anunciar a conferência que Boaventura Sousa Santos (BSS) aí organiza no dia 28 de Abril de 2012 sob o tema “Espaços de Transformação – epistemologias do sul”, no âmbito do processo de investigação centrado na reinvenção da emancipação social que o sociólogo português tem vindo a editar nos últimos seis anos. Debatem o tema com BSS: Shiv Visvanathan, Professor no Dhirubhai Ambani Institute de Tecnologias de Informação e Comunicação em Gandhinagar, Gujarat; Sarat Maharaj, Professor de Arte Visual e Sistemas de Conhecimento na Universidade de Lund e da Academia de Arte de Malmoe, Suécia; Suely Rolnik, psicanalista e crítica de arte e cultura na Universidade Católica de São Paulo.
A obra de BSS é certamente controversa mas o reconhecimento internacional que a sua investigação tem hoje nos meios científicos europeus e mundiais em geral não tem equivalente na família das ciências sociais em Portugal. Não sendo um profundo conhecedor da pesquisa mais recente de BSS, o tema da conferência da Tate que corresponderá ao último volume da série Reinventing Social Emancipation: Towards New Manifestoes, interessa-me por uma razão muito particular.
A minha formação na teoria do desenvolvimento começou sob o lema da crítica ao etnocentrismo ou, como também então se dizia, o “ocidentrismo”. Sob o fogo da crítica estava a conceção determinista da história, a pretensão de que o modelo de desenvolvimento original do ocidente poderia ser concebido como referencial de todos os processos de rotura com o subdesenvolvimento. A economia mundial evoluiu, o desenvolvimento desigual persistiu mas assumiu novas formas e, como seria inevitável, as ciências sociais que lidam mais de perto com o desenvolvimento teriam de experimentar o impacto da profunda transformação dos outros mundos.
Se então o que estava sob a mira da nossa crítica era a transposição para esses mundos da experiência ocidental transformada em paradigma, o que BSS agora nos propõe é algo de inverso e ainda mais plural. É a necessidade da Europa aprender com outros mundos e daí o sugestivo lema das epistemologias do sul. Ou, nas palavras do próprio BSS, “A compreensão do mundo transcende em muito a compreensão Ocidental desse mesmo mundo”.
Do ponto de vista da evolução dos paradigmas da teoria do desenvolvimento, trata-se de facto de uma crítica mais decisiva e profunda a qualquer resquício de etnocentrismo que por aí subsista. Tal como as ciências sociais ocidentais, particularmente a sociologia americana, ficaram chocadas com a dimensão religiosa da revolução iraniana, sobretudo com a dimensão gigantesca daqueles movimentos de massas, também hoje os movimentos de participação democrática da primavera árabe suscitaram surpresa, incompreensão, leituras precipitadas.
O convite que a investigação coordenada por BSS nos faz à aprendizagem de contacto com outros mundos e movimentos cívicos é em si fascinante como caminho de investigação social futura. Mas adquire um especial significado no contexto do fechamento de soluções a que as sociedades ocidentais estão hoje submetidas. E, para além disso, “epistemologias do sul” é um domínio em que as ciências sociais nativas podem movimentar-se com à vontade. Aliás, a sociedade portuguesa está particularmente apta para esse diálogo. Haja intuição e inteligência políticas para o explorar devidamente.

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