A imagem do
monumento que Óscar Niemeyer dedicou ao Movimento dos sem Terra é escolhida
pelo sítio da Tate Modern em Londres para anunciar a conferência que Boaventura Sousa Santos (BSS) aí organiza no dia 28 de Abril de 2012 sob o tema “Espaços
de Transformação – epistemologias do sul”, no âmbito do processo de
investigação centrado na reinvenção da emancipação social que o sociólogo
português tem vindo a editar nos últimos seis anos. Debatem o tema com BSS: Shiv Visvanathan,
Professor no Dhirubhai Ambani Institute de Tecnologias de Informação e
Comunicação em Gandhinagar, Gujarat; Sarat Maharaj, Professor de Arte Visual e
Sistemas de Conhecimento na Universidade de Lund e da Academia de Arte de
Malmoe, Suécia; Suely
Rolnik, psicanalista e crítica de arte e cultura na Universidade
Católica de São Paulo.
A obra de BSS é
certamente controversa mas o reconhecimento internacional que a sua
investigação tem hoje nos meios científicos europeus e mundiais em geral não
tem equivalente na família das ciências sociais em Portugal. Não sendo
um profundo conhecedor da pesquisa mais recente de BSS, o tema da conferência
da Tate que corresponderá ao último volume da série Reinventing
Social Emancipation: Towards New Manifestoes, interessa-me por
uma razão muito particular.
A minha formação
na teoria do desenvolvimento começou sob o lema da crítica ao etnocentrismo ou,
como também então se dizia, o “ocidentrismo”. Sob o fogo da crítica estava a
conceção determinista da história, a pretensão de que o modelo de
desenvolvimento original do ocidente poderia ser concebido como referencial de
todos os processos de rotura com o subdesenvolvimento. A economia mundial
evoluiu, o desenvolvimento desigual persistiu mas assumiu novas formas e, como
seria inevitável, as ciências sociais que lidam mais de perto com o
desenvolvimento teriam de experimentar o impacto da profunda transformação dos
outros mundos.
Se então o que
estava sob a mira da nossa crítica era a transposição para esses mundos da
experiência ocidental transformada em paradigma, o que BSS agora nos propõe é
algo de inverso e ainda mais plural. É a necessidade da Europa aprender com
outros mundos e daí o sugestivo lema das epistemologias do sul. Ou, nas
palavras do próprio BSS, “A compreensão do mundo transcende em muito a compreensão
Ocidental desse mesmo mundo”.
Do ponto de vista
da evolução dos paradigmas da teoria do desenvolvimento, trata-se de facto de
uma crítica mais decisiva e profunda a qualquer resquício de etnocentrismo que
por aí subsista. Tal como as ciências sociais ocidentais, particularmente a
sociologia americana, ficaram chocadas com a dimensão religiosa da revolução
iraniana, sobretudo com a dimensão gigantesca daqueles movimentos de massas,
também hoje os movimentos de participação democrática da primavera árabe
suscitaram surpresa, incompreensão, leituras precipitadas.
O convite que a
investigação coordenada por BSS nos faz à aprendizagem de contacto com outros
mundos e movimentos cívicos é em si fascinante como caminho de investigação
social futura. Mas adquire um especial significado no contexto do fechamento de
soluções a que as sociedades ocidentais estão hoje submetidas. E, para além disso,
“epistemologias do sul” é um domínio em que as ciências sociais nativas podem
movimentar-se com à vontade. Aliás, a sociedade portuguesa está particularmente
apta para esse diálogo. Haja intuição e inteligência políticas para o explorar
devidamente.
Sem comentários:
Enviar um comentário