Pedro Passos Coelho (acima caricaturado em http://marioteixeiracomics.blogspot.pt) concedeu uma entrevista à brasileira “Veja”, datada de hoje, à qual foi dado o sugestivo título “O estado no seu devido lugar”. Dois momentos definem o perfil do estadista que nos comanda.
Em face da interrogação sobre o que diz aos portugueses que culpam a chanceler alemã Angela Merkel e o presidente francês Nicolas Sarkozy pela crise europeia, avança perentório: “Esse é um clichê muito difundido na imprensa. O fato de Alemanha e França procurarem soluções para a crise resultou na ideia errônea de que eles eram de certa forma responsávei ou até beneficiários dessa situação. Nada mais exagerado. Primeiro porque, apesar de serem os líderes de duas das principais economias europeias, as decisões finais sobre os rumos do bloco são tomadas por um comitê mais amplo de chefes de governo e de estado.”
Será! Mas, senhor Primeiro-Ministro, “não condiz a cara com a careta”! E não me refiro a quaisquer teses de tantos perigosos keynesianos que por aí andam a propalar mais Estado, antes ao que ouvimos ao seu Presidente da República na antena da TSF, ainda não há muito mais de um mês:
· Quanto à “influência excessiva da França e da Alemanha nos assuntos europeus”: “Dando como que a ideia, ou projetando a ideia, de que as coisas são decididas a dois, depois são apresentadas ao conjunto dos 27 e aí se decide de acordo com o que vinha do diretório. Sabe, eu acho que isto é bastante negativo, porque põe em causa a coesão, põe em causa o espírito de unidade, põe em causa o espírito de solidariedade.”
· Relativamente à forma como a Europa reagiu à crise, renovando críticas à “má gestão” feita, falando de “cacofonia”, lamentando que se tenha andado “de atraso em atraso, de irrealismo em irrealismo”, referindo a “verdadeira saga” que precedeu o acordo para a Grécia, apontando a “cobardia política dos líderes europeus”.
· Sobre responsabilidades: “Não se critique apenas a Grécia, não se critique apenas a Irlanda, não se critique apenas Portugal, que podem ter tido as suas responsabilidades por terem ultrapassado alguns limites em matéria de desequilíbrio orçamental, de dívida pública e de dívida externa. Agora, o certo é que a supervisão multilateral não foi realizada por quem a competia realizar com a eficácia com que devia ser realizada.”
Um segundo momento tem a ver com lavagem de roupa suja e auto-flagelação, fora de casa e para exterior ver como claramente recomendável! Com efeito, e falando para a revista de maior circulação no mundo de língua portuguesa, Passos exclama intrépido que “a situação adversa que Portugal vive hoje não veio em consequência das decisões de Merkel ou de Sarkozy”. Depois, num assomo de verdade certamente inspirador de novas anedotas sobre a “terrinha”, acrescenta: “Os desequilíbrios existentes em Portugal são resultado de más decisões tomadas por nós mesmos. Usamos mal o dinheiro, selecionamos mal os projetos de obras públicas, aumentamos os impostos para gastar em serviços de pouco valor, não flexibilizamos suficientemente o mercado de trabalho, não abrimos a economia… Os líderes europeus não agravaram nossos problemas. Ao contrário, eles nos ajudaram a encontrar uma saída para eles.”
E, para que não fique pedra sobre pedra, completa assim a sua corajosa proclamação da verdade: “O fato de Portugal ter entrado na zona do euro facilitou o financiamento de obras e tornou a seleção dos projetos frouxa e pouco exigente. Como resultado, Portugal ganhou uma rede de estradas muito além das nossas necessidades. Não há tráfego que justifique todos os investimentos feitos na malha viária. Desperdiçamos muito dinheiro em projetos sem retorno financeiro. Sucessivos governos também aumentaram as despesas com gasto de pessoal e serviços sociais, como educação, aposentadorias e seguro-desemprego, que hoje equivalem a toda a receita tributária. O resto é déficit.” Cristalino e arrasador!
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