O “Financial Times” divulga a infografia
acima, muito útil como elemento de síntese sobre a primeira parte das eleições
presidenciais francesas e o respetivo resultado ao intervalo, para além de
algumas comparações com atos semelhantes anteriores.
Sobre esta matéria, gostaria ainda sublinhar
que não
esteve só nas comparações programáticas a “forma apressada e leviana” (como
aqui dizia ontem o António Figueiredo) com que Marcelo Rebelo de Sousa fez o
seu comentário de domingo. Esteve também num indesculpável mecanicismo
analítico, algures a meio caminho entre um básico lapalissiano e um “partisan”
disfarçado.
Como quando referia: “a direita tem uma maioria matemática mas
essa maioria só vale se todos os votantes de extrema-direita votarem Sarkozy,
além dos votantes do centro”. Ou, baralhando e voltando a dar: “mas o pleno da
esquerda dá 40 e tal por cento, quando o pleno da direita dá à volta dos 50 ou
acima dos 50%”. Ou, mais normativo: “resta saber se essa direita vota toda em
Sarkozy”, “Bayrou vai ser sujeito a uma grande pressão da família do PPE” e “o
problema é a Marine Le Pen”.
Com efeito, e como uma vez disse António
Guterres, basta fazer as contas. Veja-se, consultando a infografia: se toda a
esquerda votar em Hollande, este perfaz 44%; se toda a direita votar em
Sarkozy, este perfaz 47%; se todo o centro (Bayrou) votar Sarkozy, este passa a
perfazer 56% e vence folgadamente. Brilhante!
Só que a aritmética eleitoral é algo
mais complexa do que isto, bem mais complexa aliás. Existe efetivamente uma
coisa chamada “reporte” e seria no âmbito de uma avaliação dessas
incontornáveis transferências de voto que se poderia esperar a intervenção útil
e com valor acrescentado por parte de um comentarista que se quisesse dar ao
trabalho de ser rigoroso.
Aqui chegado, e não obstante o
irredutível simplismo a que necessariamente acabamos por ser reconduzidos (nunca
há dois dias iguais, as transposições têm determinantes múltiplas e por vezes
inescrutáveis, as abstenções são estatisticamente ingeríveis, etc.), decidi-me
a simular essa realidade através de um exercício que assume dois pressupostos:
·
os votantes de Hollande e Sarkozy (acrescentados dos
de Aignan) à primeira volta repetem a sua escolha (pressuposto lógico);
·
a repartição de votos dos restantes três blocos de
votantes (total à esquerda de Hollande, centristas de Bayrou e extrema-direita)
ocorre de acordo com o pior cenário atualmente disponibilizado pelos institutos
de sondagens para as cores de Hollande, a saber: Mélenchon e restante esquerda
82% (H) – 6% (S) – 12% (A); Bayrou 32% (H) – 40% (S) – 28% (A), aqui usando a
estimativa de redistribuição de 2007 por ser ainda mais gravosa do que qualquer
das presentes; Le Pen 18% (H) – 60% (S) – 22% (A).
Assim obtive, então, aquele que poderá ser
o ponto de situação de hoje: 51,7% para François Hollande, ou seja, uma vitória
pouco mais que tangencial (possibilidade ilustrada acima por Niels Bo Bojesen
em “Jyllands-Posten”, Aarhus, http://jp.dk). O que
significa que “le jeux n’est pas fait” e tudo está em aberto, incluindo o
sucesso da desesperada tentativa de Sarkozy para não largar o poder (acima
ilustrada por Joep Bertrams em “Het Parool”, Amesterdão, http://www.parool.nl).
Muito dependerá,
pois, da estratégia, do comportamento e da prestação dos principais agentes
envolvidos, sem prejuízo de até poderem vir a interferir factos que lhes sejam
exógenos. A única coisa que é mesmo de todo improvável é que, em algum momento,
venha a existir aquilo a que Marcelo chamou “o pleno da direita”. Coisas da
vida…
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