Se as autoridades
portuguesas pensavam num qualquer casamento de circunstância para colocar a
Ibéria mais forte face aos perigos da crise das dívidas soberanas, talvez valha
a pena não juntar os trapinhos. Casarão com o epicentro do turbilhão que de
novo afronta a zona euro. Todo o bom comportamento do candidato português ao
referido casamento de conveniência corre o risco de virar ruína, pois o par
espanhol está no meio da sua própria embrulhada. Persistindo a austeridade como
sendo a preferida terapia da Comissão Europeia, lá teremos a já conhecida
contração do mercado interno e um destino fulcral das nossas exportações, neste
caso, as de proximidade, experimentará um significativo recuo, complicando toda
a estratégia do resgate nacional em curso.
Porém, há um
aspeto da situação espanhola que tem sido pouco abordado e que vale a pena
sublinhar. A Espanha, à data da Grande Recessão de 2008, não enfrentava um
problema de dívida soberana. Mas o peso da dívida privada é preocupante, o que
significa que com esta dimensão de problema a nível privado, este setor entrará
necessariamente num processo de “desalavancagem” e não estará em condições de
suportar tão um processo de revigoramento do consumo e do investimento. Colocar
o setor público simultaneamente na mesma posição conduzirá naturalmente a
economia espanhola a uma longa retração e Portugal que se cuide. O economista
Richard Koo do Nomura Research Institute, já aqui abundantemente citado neste
blogue, foi talvez dos primeiros a sublinhar esta especificidade espanhola.
Hoje, no Público,
o catedrático de Economia Emílio Ontiveros alinha na mesma linha de argumentação,
precisando que os cerca de 300% do PIB da dívida privada pode, pela via da erosão
dos ativos bancários, transformar um problema de dívida privada em dívida pública.
E, para não variar, conclui pela necessidade de coexistência de uma estratégia
mais consistente de crescimento económico combinada com a necessária
flexibilização do défice público, por muito que o senhor Rehn torça o nariz. Esta
ideia é coerente com a evidência que passou pela imprensa económica
internacional segundo a qual foram essencialmente os bancos espanhóis que
beneficiaram das operações de financiamento a três anos promovidas em Dezembro
2011 e Fevereiro de 2012 pelo BCE.
Estou curioso em
saber se a arrogância com que os populares chegaram ao poder se vai manter
intacta, tirando oportunísticamente partido da teimosia das autoridades
europeias e fazendo passar por essa via “reformas” que em escrutínio político
aberto nunca passariam na sociedade espanhola. Não terá sido por acaso que a
apresentação do orçamento 2012 terá sido adiada para não impactar (sem êxito,
diga-se) as eleições regionais das Astúrias e da Andaluzia.
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