Apesar das
diatribes do clima, as aleluias estão no seu fulgor máximo, a urze de cor
indescritível começa a emergir nas encostas e o verde irrepetível dos carvalhos
acompanha uns dias em Seixas, Caminha, num ritual de reencontro com ciclos de
trabalho-lazer que vai dando sentido a esta vida.
Numa semana que
convidaria à distensão e à acalmia das tendências, o PS regressa belicoso às
suas guerras de sempre, pequenas guerras entenda-se, sem que se vislumbre
nenhum combate efetivo de ideias e um rumo possível de programa político
alternativo, que não significaria obviamente a anulação de tendências de
pensamento e sobretudo de memórias. O problema parece ser de facto este: são
mais memórias e idiossincrasias que não se querem beliscar do que propriamente
combate de ideias viradas para uma alternativa de governação. E se assim for, o
PS está feito e com isso a alternância democrática também. Se é de memórias e
idiossincrasias que se trata então levará algum tempo a dissipá-las.
Parece que não
seria necessário um génio da intuição política para compreender que um grupo
parlamentar constituído por uma fração significativa de personalidades
conotadas ou mesmo identificadas com a governação Sócrates representaria sempre
um constrangimento muito forte a qualquer tentativa de libertação dessa
herança, pese embora a presença do memorando da Troika. Mas mais do que
personalidades conotadas ou simplesmente conotadas com a governação de Sócrates,
temos intérpretes e executores dessa governação. Ora neste contexto ou tais
personalidades vendem a alma, retratam-se na praça pública como nos velhos
tempos ou então será sempre difícil afastá-los de uma defesa da “honra política”,
afirmando a bondade das suas propostas levadas à prática. E o que é paradoxal é
que há casos em que tal defesa se justificaria, pois ao contrário de uma visão
simplista a governação anterior teve domínios que mereceriam aprofundamento e não
o seu contrário. Mas ter no parlamento os fantasmas de algumas parcerias público-privadas,
como por exemplo as relacionadas com as infraestruturas rodoviárias, não lembra
ao diabo. A tendência natural é discutir e justificar o passado e não discutir
uma alternativa de governação.
E o que espanta é
que há condições para discutir uma alternativa. Ao propósito de fazer passar
sem escrutínio político alargado uma modelo de Estado mínimo há vários temas
que proporcionam visões alternativas possíveis de futuro: a legislação laboral,
o que fazer das parcerias público-privadas, a configuração do sistema público
de saúde, o modelo económico para a competitividade externa e a sua articulação
com os investimentos em ciência e tecnologia já realizados e de efeitos a longo
prazo, a abordagem ao desemprego estrutural, só para mencionar os mais
evidentes. Em torno destas questões, é possível simultaneamente discutir
abertamente o passado recente e construir uma visão de futuro e de esperança
para uma larga franja da população portuguesa. Nesse debate não há lugar para
memórias ou simples idiossincrasias. Até porque as personalidades que se
refugiam na sua invocação não terão certamente nada a dizer sobre tais questões.
E, pelo menos, uma coisa se consegue: menos ruído no debate.
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