Passei uns dias em Londres, numa missão privada. Para “foreigners” do meu tipo, circular por lá implica recorrer predominantemente ao metro. E a enorme extensão de linhas e estações do “underground” leva-nos a uma absorção quase inconsciente de tudo quanto mexa e nos possa ir ocupando o espírito. Com destaque para tão relevantes motivos de oferta como são a diversidade das gentes e a regularidade dos hábitos ou, também, a leitura gratuita profusamente distribuída ou simplesmente largada nas carruagens e apeadeiros por consumidores já saciados. Juntei assim vários recortes de curiosidades, nem todas igualmente (ir)relevantes, de que passo a dar conta numa seleção sumária e descriteriosa.
1. Em 1960, existiam 626 pessoas centenárias na Grã-Bretanha; estima-se que, um século depois (2060), existam quase 456 mil. Porque uma em cada três crianças nascidas hoje no Reino Unido viverá até aos 100 anos. Mas esta história não corresponde necessariamente a uma boa notícia, havendo mesmo quem a classifique de “cenário de pesadelo”. E o grave não está no acréscimo de trabalho e de despesa que – a manter-se a tradição de ser enviado um telegrama real por ocasião do centésimo aniversário de cada cidadão – assim decorrerá para o monarca que venha a suceder a Isabel II: 18 pessoas por dia no próximo ano, 260 em 2047. A verdadeira questão está no inevitável aumento exponencial de pessoas com demência – hoje 800 mil (1 em cada 14 acima dos 65 anos, 1 em cada 6 acima dos 80, 1 em cada 3 acima dos 90), mas a duplicar numa geração e a triplicar em termos de custos. A longevidade é um enorme progresso, mas é um progresso que exige ser devidamente gerido…
2. Enid Blyton (600 milhões de livros mundialmente vendidos em 90 línguas) foi uma autora de literatura juvenil marcante para a minha geração. Quem não leu os 21 volumes de “As Aventuras dos Cinco” (“The Famous Five”)? E a sua continuidade, após sucesso retumbante, com base nas aventuras do chamado “Clube dos Sete” (“Secret Seven”)? Pois bem, aquele quinteto acaba de completar 70 anos e a editora Hachette UK decidiu encetar uma reescrita daqueles clássicos em moldes mais consentâneos com a linguagem e os hábitos da atual era digital (acima a nova capa do número 1 da série). Uma informação que li com satisfação e que, sobretudo, me transportou para bem longe no meu baú das recordações…
3. A propósito da anunciada inauguração na “Tate Modern” (5 Abril) de uma exposição de cinco meses dos trabalhos dos últimos vinte anos de Damien Hirst – um dos mais controversos e influentes autores da arte contemporânea, considerado como o “enfant terrible” da arte britânica e um dos homens mais ricos do país (em 2008 atingiu o recorde mundial de leiloar trabalhos num montante de £111 milhões) – a polémica atingiu o paroxismo. Com o crítico Julian Spalding – que acaba de publicar um livro sugestivamente condenatório da arte concetual: “Con Art – Why Ought To Sell Your Damien Hirsts While You Can” – a declarar que os trabalhos de Hirst são “o ‘subprime’ do mundo da arte” e a reforçar tal posição nos seguintes termos: “Algumas pessoas argumentam que Damien Hirst é um grande artista. Algumas dizem que ele é um artista execrável, e outras colocam-no mais enfadonhamente algures a meio caminho. Estão todos a falhar o alvo. Damien Hirst não é um artista. (…) Mas não têm [os seus trabalhos] conteúdo artístico e são destituídos de valor como obras de arte. São, portanto, financeiramente sem valor.” Leigo, não pude deixar de pensar naquele homem que um dia pintava as paredes bem recheadas do gabinete do Artur Santos Silva…
4. Os liberais democratas, parceiros de coligação do Partido Conservador de David Cameron, terão bloqueado possíveis avanços na aplicação de um relatório que contava com o apoio do primeiro-ministro. Tratava-se de uma proposta elaborada pelo capitalista de risco Adrian Beecroft, chairman da “Dawn Capital”, no sentido de uma muito significativa diluição/destruição de direitos dos trabalhadores nas empresas e no emprego. A coisa mais interessante é, contudo, a que decorre do facto de o proponente ser um doador importante dos “Tories” (£593 mil desde que Cameron assumiu a liderança, em 2005). Em tempo de alterações ao Código de Trabalho por cá, sublinhe-se que por lá as ações e as razões têm cara…
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