No seu post de 31 de Março, o António Figueiredo referiu aqui a “razão e pertinência” que atribuía à posição crítica de Rui Rio em relação ao financiamento pela Caixa Geral de Depósitos (CGD) da operação pública de aquisição da José de Mello e Arcus à Brisa.
O financiamento ascenderia a “cerca de 2/3” do valor da operação. Ora, o “Jornal de Negócios” de hoje diz saber que a CGD apenas aceitou financiar 88 milhões de euros dos 700 que a OPA poderá exigir em caso de todos os acionistas aceitarem vender (ou dos 590 que estará acordado caberem aos três maiores bancos portugueses). O que significa que, em oito dias, o envolvimento previsível da CGD conheceu um notório decréscimo – “et pour cause”…
De um modo ou de outro, Rui Rio esteve esta semana no “Olhos nos Olhos” da TVI 24 e lá confirmou, com toda a exuberância, o essencial da informação existente quanto à sua opinião na matéria. Que resumo em seis grandes tópicos:
· Enquadrando: “Nós temos de induzir o crescimento. Induzir o crescimento é extraordinariamente difícil quando temos de apertar na despesa pública porque senão não cumprimos os critérios. Aliás o critério que temos de cumprir tem um numerador e um denominador; no numerador está a despesa, no denominador está o PIB; se nós cortarmos em cima, mas ele também cair em baixo, continuamos sem cumprir aquilo que temos de cumprir. Portanto, o exercício é dificílimo.”
· Mostrando revolta: “Repare nisto que eu levantei há dois dias e que é para mim um verdadeiro escândalo: com a economia no estado em que está – eu conheço empresas que têm carteira para exportar e não conseguem o crédito para comprar as matérias-primas e lá vai a exportação. E é neste enquadramento que o banco público do Estado – em lugar de fornecer o crédito à economia, designadamente a quem produz bens transacionáveis e que pode exportar ou substituir importações – vai financiar uma operação de mercado secundário, ou seja, a transação da propriedade de ações de uma empresa para outra.”
· Insistindo: “A Caixa Geral de Depósitos vai emprestar dinheiro a um grupo português que cumpre o seu papel, faz o seu papel. Só que a Caixa é que não está a fazer o seu: vai emprestar dinheiro a um grupo português para ele comprar uma posição na Brisa a um grupo espanhol. (…) Isto é um escândalo. Porque esse dinheiro que está ali faz falta a muitas pequenas empresas que precisam de vender, precisam de trabalhar, precisam de exportar a bem do País. E estamos numa coisa de engenharia financeira, apenas para mudar o controlo acionista de uma empresa. Isto não faz sentido rigorosamente nenhum.”
· Prosseguindo: “Eu posso dizer uma coisa: eu quando me vejo em situações destas, na minha vida já me vi em situações destas, só por cima do meu cadáver. Porque nós temos de saber exatamente o que queremos e depois de sabermos o que queremos nós não podemos sair da linha, porque senão nós não nos entendemos. E isto é autenticamente, em minha opinião, um boicote àquilo que o País tem de fazer neste momento.”
· Pondo alguma água na fervura: “Isto não é o Governo, isto é a Caixa Geral de Depósitos. Poderá dizer que o Conselho de Administração da Caixa foi escolhido pelo Governo, e isso é verdade. Eu não sei em que medida, qual é o relacionamento, se permite uma coisa dessas.”
· Concluindo: “E não é só a Caixa Geral de Depósitos, eu devo-lhe dizer mais: acho que toda a outra banca, mesmo a banca privada, tem uma obrigação de solidariedade nacional, tem uma obrigação patriótica de ajudar o País. E não é isso que muitas vezes nós vemos. (…) Os portugueses têm aceite tudo, têm sido notáveis. E depois há uma elite que, em muitas circunstâncias, não é solidária com as pessoas que estão a sofrer, e há muita gente que está a sofrer. Por isso me choca aquilo que a Caixa Geral de Depósitos agora está a fazer.”
E a pergunta é: tem isto alguma coisa a ver com a posição de Passos a favor da privatização, pelo menos parcial, da CGD? Ou, mais concetualmente: para que serve, afinal, a defesa da existência de um banco público? Ou ainda, mais ao jeito de desabafo: eles são incorrigíveis, não são?
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