terça-feira, 28 de abril de 2015

FUI OUVIR PIKETTY


Estive neste final de tarde no Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian a ouvir em direto o economista do momento, o francês Thomas Piketty, apresentando o seu best-seller “O Capital no Século XXI”. Não só a sala estava à cunha como havia gente por todo o lado, ocupando outros espaços (incluindo o hall em frente ao bengaleiro) com ecrãs especialmente colocados para efeitos de satisfação de tão inusitada procura. Também revelador que na sala estivessem personalidades pouco habituais nestas andanças das conferências de Economia, como sejam Jorge Sampaio e o professor Marcelo, António Costa e Joaquim Sousa Ribeiro, muitos ex-ministros e gestores empresariais de nomeada, embaixadores e institucionais, intelectuais e académicos, num infindável cortejo de celebridades. Destaque ainda para a apresentação inicial pelo presidente da Fundação, Artur Santos Silva, e para a presença dos dois grandes facilitadores do evento, João Caraça e Gustavo Cardoso.

Não cabem obviamente neste espaço grandes considerações em torno da intervenção de Piketty, aliás muito igual a si próprio e excessivamente centrado em alguns temas do seu livro de referência. Direi apenas que abriu com o gráfico acima – chamando a atenção para a evolução das desigualdades de rendimento na Europa e nos Estados Unidos desde o início do século XX –, que passou pela evidência de as desigualdades na distribuição da riqueza serem largamente superiores às da distribuição dos rendimentos e por uma perceção da evolução temporal do capital público versus capital privado, terminando com um apontamento sobre a dimensão fiscal – detendo-se, especialmente, nas taxas incidentes sobre os rendimentos mais elevados (gráfico abaixo) e sobre heranças (aqui apoiando explicitamente a medida proposta pelo grupo dos 12 do PS de fazer regressar o imposto sucessório ao sublinhar que há taxas mais ou menos altas mas zero como cá...).

Tempo ainda para o que designou por uma “boa notícia” (os ativos privados têm vindo a aumentar muito mais significativamente do que a dívida pública), para uma denúncia da insustentabilidade de uma situação como a atual em que a riqueza acumulada pelos maiores detentores cresceu triplamente em relação à riqueza média mundial, para uma crítica violenta às incapacidades da Zona Euro e para a defesa de um sistema fiscal “genericamente favorável às novas gerações”.

Defeito meu certamente, mas a sessão terá deixado algo a desejar relativamente ao que prometia e ao que podia ter sido face à qualidade do seu protagonista. Digamos que valeu pelo facto de ter servido para que por cá se falasse seriamente em desigualdade, de modo equivalente ao facto de duas décadas atrás Michael Porter nos ter vindo ajudar a colocar a competitividade na agenda. Embora o irritante inglês afrancesado de Piketty, por muito que treinado em Harvard, pouco tenha a ver com o genuíno e tivesse deixado no ar a ideia de que talvez tudo resultasse melhor em francês...

Sem comentários:

Enviar um comentário