(Thomas Antony, http://www.irancartoon.com)
Morreu hoje, aos 87 anos, o escritor alemão Günter Grass, Prémio Nobel da Literatura em 1999. Mais do que um dos grandes romancistas mundiais do século XX e do que um autor incontornável do “realismo mágico europeu” – com o seu primeiro romance, “O Tambor” (a tradução portuguesa é assinada por Abelaira), a constituir a sua principal obra de referência no quadro desse género literário a que razões que não vêm ao caso me levam a um crescendo de sensibilidade –, GG foi sobretudo (como já aqui assinalamos em post de 7 de abril de 2012) uma espécie de “consciência moral” da Alemanha e da esquerda intelectual europeia. Polémico, quiçá às vezes contraditório e até estranho – conheci quem com ele tenha convivido nos idos de 1974 na zona de Hamburgo, GG assumiu posições políticas marcantes ao lado de Willy Brandt, nunca deixando depois de ser um compagnon de route dos social-democratas, e abraçou causas incómodas como as da crítica da reunificação alemã (e como tudo teria sido diferente se tivesse sido ouvido!), do expansionismo israelita ou da posição alemã/europeia em relação à Grécia – sobre esta última, deixou um poema de 2012 que intitulou “A Vergonha da Europa” e abaixo transcrevo in memoriam.
“À beira do caos porque fora da razão dos mercados,
Tu estás longe da terra que te serviu de berço.
O que buscou a Tua alma e encontrou
rejeita-lo Tu agora, vale menos do que sucata.
Nua com o devedor no pelourinho sofre aquela terra
a quem dizer que devias era para Ti tão natural como falar.
À pobreza condenada a terra da sofisticação
e do requinte que adornam os museus: espólio que está à Tua cura.
Os que com a força das armas arrasam o país de ilhas
abençoado levavam com a farda Holderlin da mochila.
País a custo tolerados cujos coronéis
toleraste outrora na Tua Aliança.
Terra sem direitos a que o poder
do dogma aperta o cinto mais e mais.
Trajada de negro. Antígona desafia-te e no país inteiro
o povo cujo hóspede foste veste-se de luto.
Contudo os sósias de Creso foram em procissão entesourar
fora de portas tudo o que tem a luz de ouro.
Bebe duma vez, bebe! grita a claque dos comissários,
mas Sócrates devolve-Te, irado, a taça cheia até à borda.
Os deuses amaldiçoarão em coro quem és e o que tens
se a Tua vontade exige a venda do Olimpo.
Sem a terra cujo espírito Te concebeu, Europa,
murcharás estupidamente.”
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