domingo, 12 de abril de 2015

O NOSSO FUTURO

(Maria Blasco, Centro Nacional de Investigaciones Oncológicas)



De toda a dinâmica de produção reflexiva neste blogue resulta claro em meu entender que se combate aqui diariamente o imperialismo do pensamento económico como fator explicativo único do futuro das coisas, por mais importante que considere melhorar a literacia económica.

Tenho assim especial apetência pelas incursões de leigo por outras ciências e não escondo o fascínio pela biologia molecular e pelo que ela representa em matéria de explicação do nosso futuro, de uma espécie com vida limitada. É sobretudo fascinante o modo como alguns cientistas dessa área cruzam o seu saber com o da compreensão do mundo.

Vem isto a propósito da leitura de uma poderosa entrevista ao El País Semanal, revista de domingo, de Maria Blasco, doutorada em bioquímica e Biologia Molecular (Universidade Autónoma de Madrid) e atualmente diretora do Centro Nacional de Investigaciones Oncológicas (CNIO). Em plena entrevista, o jornalista fixa-se na evidência do maior número de óbitos das sociedades ocidentais estar a concentrar-se em doenças como perturbações do sistema cardiovascular, cancro, diabetes, sistema nervoso, o que o leva a perguntar se essa regularidade recente irá manter-se no próximo século. Maria Blasco chama a atenção na sua resposta para uma alteração de paradigma que ela considera não ser de conhecimento generalizado:

“Todas essas doenças são simplesmente a consequência de uma causa molecular, uma causa biológica que é o processo de envelhecimento celular. Ou seja, conforme vão passando os anos as nossas células vão perdendo o seu estado de forma, vão envelhecendo e é isso que causa a doença. Esse é precisamente o meu campo de investigação. Assim, a nossa maneira de agora encarar estas doenças como o cancro ou as cardiovasculares é que têm uma origem similar, que é o processo de envelhecimento celular. E houve uma ciência de altíssima qualidade, uma ciência muito rompedora de ideias feitas nos últimos, diria, quinze ou vinte anos e que começou a desvendar quais são estas causas moleculares e também pela primeira vez depois de muitos anos que alterar apenas uma destas causas atrasaria todas estas doenças. (…) Todas? Sim assim é. É para aí que o futuro evolui. O futuro vai conduzir-nos a formas de cancro ou de outras doenças cardiovasculares. Mas o futuro vai também trazer-nos alguma possibilidade de retardar o seu aparecimento. E isto porquê? Porque o fundamental é permanecer são e saudável o maior tempo possível. É a isto que se chama alargar o tempo de vida de juventude. Esse é um dos grandes desafios, uma das grandes revoluções na madeira de ver a doença e uma das coisas em que vão observar-se mais progressos.

É algo de parecido com o elixir da eterna juventude … Não, aqui falamos de conquistas científicas. É muito complexo, porque o problema tem uma parte genética e uma outra ambiental. Em que percentagem? Digamos 20% de genético e 80% de ambiental. Ou seja, os hábitos de vida. Há um estudo realizado na Dinamarca com gémeos resultantes de fecundação de óvulos distintos sem a mesma dotação genética que confirma o que estou a dizer. Nesses 80% inclui-se todo o tipo de vida que levamos, em que cidade vivemos, a sorte ou má sorte que temos tido, o stresse laboral ou emocional, independentemente da genética. Adicionemos também a sorte da vida, o azar, onde estivemos, o que fizemos. São coisas que nem tão pouco são por nós decididas, pode ser que tenhamos tido um acidente, que nos tenha morrido um filho … tudo isso influencia os 80%”.

Simplesmente fascinante ou aterrador?

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