(Maria Blasco, Centro Nacional de Investigaciones Oncológicas)
De toda a dinâmica de produção reflexiva neste blogue
resulta claro em meu entender que se combate aqui diariamente o imperialismo do
pensamento económico como fator explicativo único do futuro das coisas, por
mais importante que considere melhorar a literacia económica.
Tenho assim especial apetência pelas incursões de leigo
por outras ciências e não escondo o fascínio pela biologia molecular e pelo que
ela representa em matéria de explicação do nosso futuro, de uma espécie com
vida limitada. É sobretudo fascinante o modo como alguns cientistas dessa área
cruzam o seu saber com o da compreensão do mundo.
Vem isto a propósito da leitura de uma poderosa
entrevista ao El País Semanal, revista de domingo, de Maria Blasco, doutorada
em bioquímica e Biologia Molecular (Universidade Autónoma de Madrid) e
atualmente diretora do Centro Nacional de Investigaciones Oncológicas (CNIO). Em
plena entrevista, o jornalista fixa-se na evidência do maior número de óbitos das
sociedades ocidentais estar a concentrar-se em doenças como perturbações do
sistema cardiovascular, cancro, diabetes, sistema nervoso, o que o leva a
perguntar se essa regularidade recente irá manter-se no próximo século. Maria
Blasco chama a atenção na sua resposta para uma alteração de paradigma que ela considera
não ser de conhecimento generalizado:
“Todas essas doenças são
simplesmente a consequência de uma causa molecular, uma causa biológica que é o
processo de envelhecimento celular. Ou seja, conforme vão passando os anos as
nossas células vão perdendo o seu estado de forma, vão envelhecendo e é isso
que causa a doença. Esse é precisamente o meu campo de investigação. Assim, a
nossa maneira de agora encarar estas doenças como o cancro ou as cardiovasculares
é que têm uma origem similar, que é o processo de envelhecimento celular. E
houve uma ciência de altíssima qualidade, uma ciência muito rompedora de ideias
feitas nos últimos, diria, quinze ou vinte anos e que começou a desvendar quais
são estas causas moleculares e também pela primeira vez depois de muitos anos
que alterar apenas uma destas causas atrasaria todas estas doenças. (…) Todas? Sim assim é. É para aí que o
futuro evolui. O futuro vai conduzir-nos a formas de cancro ou de outras
doenças cardiovasculares. Mas o futuro vai também trazer-nos alguma
possibilidade de retardar o seu aparecimento. E isto porquê? Porque o
fundamental é permanecer são e saudável o maior tempo possível. É a isto que se
chama alargar o tempo de vida de juventude. Esse é um dos grandes desafios, uma
das grandes revoluções na madeira de ver a doença e uma das coisas em que vão observar-se
mais progressos.
É algo de parecido com o elixir da
eterna juventude … Não, aqui falamos de conquistas científicas. É muito complexo,
porque o problema tem uma parte genética e uma outra ambiental. Em que percentagem? Digamos 20% de genético e 80% de
ambiental. Ou seja, os hábitos de vida. Há um estudo realizado na Dinamarca com
gémeos resultantes de fecundação de óvulos distintos sem a mesma dotação genética
que confirma o que estou a dizer. Nesses 80% inclui-se todo o tipo de vida que
levamos, em que cidade vivemos, a sorte ou má sorte que temos tido, o stresse
laboral ou emocional, independentemente da genética. Adicionemos também a sorte
da vida, o azar, onde estivemos, o que fizemos. São coisas que nem tão pouco são
por nós decididas, pode ser que tenhamos tido um acidente, que nos tenha morrido
um filho … tudo isso influencia os 80%”.
Simplesmente fascinante ou aterrador?
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