quarta-feira, 22 de abril de 2015

SALÁRIOS, PRODUTIVIDADE E CLASSES MÉDIAS



Desculpem a insistência mas o tema classes médias está entre as minhas preocupações intelectuais e de pesquisa de momento. Por razões de mero interesse intelectual e sobretudo porque tenho à perna a participação no estudo para a OIT sobre classes médias coordenado a partir da Faculdade de Economia do Porto pela colega Pilar González. Alguém que esteja interessado na dinâmica social e de transformação que costumamos associar ao desenvolvimento não pode deixar de se focar no que está a acontecer a esse conjunto de grupos sociais e às aspirações de progressão social que as classes médias protagonizaram nos anos de ouro do capitalismo.

O tema tem interessado os economistas em função de várias entradas, o que não significa ignorar que as restantes ciências sociais têm muito a dizer nesta matéria, sobretudo do ponto de vista da tipificação das classes sociais que integramos no conceito de classe média. As entradas que os economistas exploram para o tema são várias: a evolução da desigualdade nas últimas três décadas (atenção à conferência de Piketty na Gulbenkian a 27 de abril de 2015 e à grande obra de Anthony Atkinson recentemente publicadaInequality what can be done? – que será tema de um dos meus próximos posts), as incidências do progresso técnico na chamada polarização dos empregos, fortemente penalizadora de profissões que regra geral identificamos com as classes médias como as profissões administrativas e a relação hoje aparentemente disfuncional entre salários e produtividade num contexto social fortemente penalizador do mundo do trabalho.

Tal como noutros domínios do debate das ideias económicas, os EUA vão claramente à frente, não apenas do ponto de vista da produção económica teórica e empírica, mas sobretudo pela ampla divulgação que o New York Times lhe tem dedicado nas suas páginas.

Hoje, trago para a colheita do tema duas referências, ambas centradas na variável salários.

Eduardo Porter assina um artigo sobre a incapacidade revelada pela economia americana de distribuir rendimento através dos salários de modo a manter a distribuição do rendimento pelo menos neutral, incapacidade que leva um dos grandes economistas do trabalho Richard B. Freeman (Harvard) a clamar pela necessidade de mobilização de outros mecanismos de distribuição do rendimento.


O outro contributo é de Jared Bernstein que comenta o facto de que não é a recuperação dos ritmos de crescimento da produtividade que permitirá ultrapassar a estagnação e a deterioração da posição das classes médias americanas. E o seu argumento é bastante forte observando, por exemplo, a evolução comparativa da produtividade e do rendimento mediano das famílias para um período longo que começa nos anos 50 até aos nossos dias. É de facto impressionante como a partir de meados dos anos 70 (ver gráfico acima) as duas curvas se destacam uma da outra. De 1943 a 1973, rendimento mediano e produtividade cresceram respetivamente 104% e 105%. De 1973 a 2013, as mesmas variáveis cresceram 13% e 107%. Números reveladores e de facto impressionantes. Uma boa orientação para o universo europeu.

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