Desculpem a insistência mas o tema classes médias está
entre as minhas preocupações intelectuais e de pesquisa de momento. Por razões
de mero interesse intelectual e sobretudo porque tenho à perna a participação
no estudo para a OIT sobre classes médias coordenado a partir da Faculdade de
Economia do Porto pela colega Pilar González. Alguém que esteja interessado na dinâmica
social e de transformação que costumamos associar ao desenvolvimento não pode
deixar de se focar no que está a acontecer a esse conjunto de grupos sociais e às
aspirações de progressão social que as classes médias protagonizaram nos anos
de ouro do capitalismo.
O tema tem interessado os economistas em função de várias
entradas, o que não significa ignorar que as restantes ciências sociais têm
muito a dizer nesta matéria, sobretudo do ponto de vista da tipificação das
classes sociais que integramos no conceito de classe média. As entradas que os
economistas exploram para o tema são várias: a evolução da desigualdade nas últimas
três décadas (atenção à conferência de Piketty na Gulbenkian a 27 de abril de
2015 e à grande obra de Anthony Atkinson recentemente publicada – Inequality what can be done? – que será
tema de um dos meus próximos posts), as incidências do progresso técnico na
chamada polarização dos empregos, fortemente penalizadora de profissões que
regra geral identificamos com as classes médias como as profissões administrativas
e a relação hoje aparentemente disfuncional entre salários e produtividade num contexto
social fortemente penalizador do mundo do trabalho.
Tal como noutros domínios do debate das ideias económicas,
os EUA vão claramente à frente, não apenas do ponto de vista da produção económica
teórica e empírica, mas sobretudo pela ampla divulgação que o New York Times
lhe tem dedicado nas suas páginas.
Hoje, trago para a colheita do tema duas referências,
ambas centradas na variável salários.
Eduardo Porter assina um artigo sobre a incapacidade
revelada pela economia americana de distribuir rendimento através dos salários
de modo a manter a distribuição do rendimento pelo menos neutral, incapacidade que
leva um dos grandes economistas do trabalho Richard B. Freeman (Harvard) a
clamar pela necessidade de mobilização de outros mecanismos de distribuição do
rendimento.
O outro contributo é de Jared Bernstein que comenta o
facto de que não é a recuperação dos ritmos de crescimento da produtividade que
permitirá ultrapassar a estagnação e a deterioração da posição das classes médias
americanas. E o seu argumento é bastante forte observando, por exemplo, a
evolução comparativa da produtividade e do rendimento mediano das famílias para
um período longo que começa nos anos 50 até aos nossos dias. É de facto
impressionante como a partir de meados dos anos 70 (ver gráfico acima) as duas
curvas se destacam uma da outra. De 1943 a 1973, rendimento mediano e produtividade
cresceram respetivamente 104% e 105%. De 1973 a 2013, as mesmas variáveis cresceram
13% e 107%. Números reveladores e de facto impressionantes. Uma boa orientação
para o universo europeu.
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