quinta-feira, 8 de março de 2012

ANDOR SABE O QUE DIZ



O nome não ajuda, mas convém seguir com atenção o que vai dizendo László Andor, Comissário Europeu dos Assuntos Sociais, se não fora por outro motivo pelo menos para contrapor regularmente as suas tomadas de posição às do glacialmente insípido e obediente Ohli Rehn, Comissário dos Assuntos Financeiros.
Sobretudo pela natureza do cargo que assume na Comissão Europeia, Andor tem sido uma das raras vozes no interior da Comissão contra a ortodoxia dominante que se esgota na consolidação fiscal enquanto via de ajustamento para a crise da dívida. Tem obrigação de o fazer, pois o domínio das questões que fazem o dia a dia dos Assuntos Sociais em Bruxelas e a evolução do desemprego estrutural na União Europeia como um todo não podem deixar de interpelar o respetivo Comissário a não subverter as evidências.
Nas suas últimas posições que têm sido registadas pela imprensa económica especializada, destaco sobretudo a sua alusão a uma prática comum nos programas de ajustamento estrutural em economias em vias de desenvolvimento: as intervenções financeiras a curto-prazo do FMI são, em regra, combinadas com intervenções a mais longo prazo, orientadas para a dinamização do investimento, co-financiadas pelo Banco Mundial. O que Andor diz e fá-lo a pensar necessariamente no papel do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD) e porque não no BEI, é que nas intervenções em curso na Grécia, Irlanda e Portugal a miopia da consolidação fiscal em sentido estrito ignora esta última componente.
Não pude deixar de refletir sobre o modo acelerado como as coisas mudaram. Ainda há poucos anos, nas minhas aulas de Desenvolvimento e Crescimento Económico e de Globalização desenvolvíamos a tese de que os modelos de ajustamento estrutural em economias em vias de desenvolvimento não poderiam ser facilmente transpostos para economias europeias como a portuguesa. Ora, ironia das ironias, ou simplesmente ironia ou reversão da história, a combinação FMI-Banco Mundial anuncia uma lógica de articulação entre curto e longo prazo (estabilização versus desenvolvimento) que seria bem necessária para o atual momento das economias do sul. Outra reversão de tendências é a estranha perceção de que a Comissão Europeia, dominada por uma ortodoxia que se infiltrou progressivamente na construção europeia por via do mercado único e das bases estatutárias do BCE, se vai perdendo numa retórica de clamar pelo crescimento, sendo totalmente incapaz de preparar bases credíveis para a sua concretização.
Estou curioso em saber se as próximas eleições europeias trarão alguns ventos favoráveis nesta matéria. Continuo a não ser particularmente entusiasta do que a campanha em França de Hollande (será do nome?) possa criar de novo nesta direção, pois não me parece que chegue para inverter ou pelo menos suster o peso da ortodoxia nas instituições europeias.

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