Cruzei-me com António Pires de Lima (APL) há mais de uma década, desempenhava ele a função de presidente executivo da Compal e eu a de presidente do FIEP. Percebi, então, através dos contactos profissionais que tivemos, que se trata de um homem inteligente, de um economista bem preparado e de um gestor competente. Como também que pensamos diferente sobre muitas coisas, para dizer depressa.
Entretanto, a vida continuou e cada um de nós prosseguiu para seu lado, ele passando designadamente a uma curta incursão pela política ativa e eu “privatizando-me” (após decidir deixar o projeto que os meus amigos Miguel Cadilhe e Carlos Tavares nunca compreenderam). Só recomecei a ver novamente APL com alguma frequência quando regressei ao Porto, cidade a que as suas opções empresariais (presidente da Unicer) também o tinham trazido; e hoje, até já é “Dragão de Ouro”…
Mas o que apreciei particularmente foi a honestidade intelectual com que – julgo que em 2008 e à luz de uma constatação factual objetiva ("são hoje muito mais evidentes do que há 10 anos os desequilíbrios económicos e sociais do País”) e, sobretudo, da sua experiência vivencial e prática de contacto com a realidade política e administrativa do país a partir de uma localização fora da Capital – assumiu publicamente uma mudança de opinião quanto à questão da regionalização: "é importante que se reflita a sério" porque "o poder político é uma condição fundamental para que o poder económico possa florescer".
APL concede este domingo uma entrevista ao “Público”. Onde mais uma vez se distancia do fácil, transformando-se em louvável exceção àquilo que aqui denunciei há dias (post de 9 de Março) como “o silêncio colaboracionista das nossas pseudoelites” a propósito de Cavaco. Cito: “O Presidente tem necessariamente um papel importante, mesmo quando é infeliz, o que é mau para Portugal, porque deixa de se constituir como reserva e essa reserva é necessária. Eu apoiei este Presidente e acho que, com momentos mais felizes e outros reconhecidamente infelizes, ele está genuinamente preocupado com os portugueses. Mas os portugueses não entendem discursos sobre preocupações pessoais. Não faz sentido que ele se queixe dos sacrifícios que a política agora lhe impõe, ninguém compreende isso. E vejo com alguma preocupação o facto de estar a centrar muitas das suas intervenções mediáticas em temas pessoais, em vez de se preocupar em ouvir e unir o país. Intervenções como a que escreveu nos ‘Roteiros’ são contraproducentes para aqueles que votaram em Cavaco Silva e esperavam uma magistratura mais consensual, mais magnânima e menos egocêntrica.”
Fora eu “jornalista por um dia” e solicitaria comentário a estas palavras junto de vários cidadãos com responsabilidades adquiridas na nossa praça e que aceitaram ser membros da Comissão de Honra da recandidatura de Cavaco... Não sendo tal o caso, resta-me recorrer de modo necessariamente truncado à “Opinião” (“Grandes manobras”) de Vasco Pulido Valente (VPV) naquela mesma edição jornalística: “O dr. Cavaco, depois de 2008, quando as coisas se começaram a complicar não abriu a boca para prevenir o país do que se passava e meter algum juízo na cabeça de Sócrates. (…) Para ele, até à reeleição para o segundo mandato só contava o voto moderado que pudesse eventualmente extorquir ao centro-esquerda. (…) O chamado ‘discurso de vitória’ era um desabafo de ressentimento e um aviso de vingança. E a vingança veio no discurso de posse, que na prática obrigava à demissão de qualquer governo com um vestígio de dignidade. Sócrates cometeu o inominável erro de resistir. Em quinze dias, o PEC IV, que ele não mostrara ao Presidente, bastou para o remover de cena, com a razão, na aparência, da parte de Cavaco. O público informado, que preza o respeitinho, esqueceu rapidamente a guerra em curso entre Belém e S. Bento. Só viu o desespero de um homem que não merecia sobreviver. E, finalmente livre, Cavaco preparou a sua próxima aventura. (….)”.
Pois é assim que, ainda que com algumas passagens discutíveis ou menos pacíficas, VPV ajuda a repor alguma verdade nos factos que os que se querem “instalados” não quiseram observar e ajuda também a contextualizar o Cavaco “contraproducente” que parecemos condenados a ter…
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