Hoje, no Público, numa crónica
intitulada “O grande sermão desta Quaresma”, Frei Bento Domingues que vale
sempre a pena ler com atenção, veicula uma fórmula que considero exemplar para
descrever o que nos apoquenta, independentemente de saber em que ponto da ponte
(metáfora) de Vítor Gaspar nos encontramos:
“Foi prometido o emagrecimento do Estado
e resultou o emagrecimento da sociedade civil.”
Trata-se de facto de uma visão que
contraria frontalmente o conceito pretensamente neutral de ajustamento
estrutural e que coloca o ponto crítico da sua avaliação no efeito contrário da
lógica que legitimou a sua apresentação. Emagrecimento do Estado é coisa que não
se vê com clareza. Antes se vê uma voracidade sem limite na sua apropriação,
enquanto que, esse sim, o quantum de energia da sociedade civil vai-se
diluindo, sobretudo pela via da insustentável situação financeira de uma larga
franja do tecido social que tem institucionalizado ou enquadrado a iniciativa da
sociedade civil. Ou seja, há custos do ajustamento que não se esgotam na dimensão
estrutural do desemprego, o qual vai evoluindo tragicamente de um modelo de
desemprego-indivíduo para um outro de desemprego-família, bem mais grave
do que o primeiro e primeiro passo para uma anemia social. Numa eventual
recuperação, a sociedade portuguesa não será mais a mesma. Terá retrocedido. E
um novo esforço será necessário para repor algum equilíbrio entre empresas,
Estado e iniciativas da sociedade civil.
E na parte final da sua crónica, Frei
Bento, refletindo sobre o Decrescimento Sereno de Serge Latouche, põe o dedo num
outro ponto nevrálgico: o modelo de crescimento não poderá ser o mesmo após uma
crise civilizacional; é antes de um novo modelo de desenvolvimento que se anda à
procura para o qual não há nem discurso de sobreaviso, nem intérpretes disponíveis,
pois a equação “crescimento-redistribuição-sustentabilidade” continua à espera
de quem proponha uma abordagem exploratória para a sua resolução.
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