Foi por demais badalada a passagem de Paul Krugman por Lisboa, onde recebeu um inédito doutoramento “honoris causa” conjunto pelas três universidades locais (situação acima caricaturada por Fernão Campos em http://ositiodosdesenhos.blogspot.com).
Pelos vistos, terá escrito o artigo para a sua habitual coluna semanal no “The New York Times” no quarto de hotel. “What Ails Europe?” (publicado a 26 de Fevereiro) começa assim: “Things are terrible here”; o que os espanhóis do “El País” traduziram quase onomatopaicamente por “Las cosas están fatal en Lisboa”.
O mote inspirador do texto centra-se na pergunta seguinte: “Why has Europe become the sick man of the world economy?” E o autor sustenta que “as histórias falsas sobre as atribulações da Europa estão a contaminar o nosso [deles, USA] discurso económico [‘helenização’, chama-lhe]". Sendo tais “histórias falsas” basicamente de dois tipos: a “versão republicana” – “a Europa está em apuros porque se esforçou demasiado na ajuda aos pobres e aos desafortunados” e assim “estamos a observar os últimos estertores do Estado de bem-estar” – e a “versão alemã” – “tudo é uma questão de irresponsabilidade orçamental”.
Quanto à primeira versão, Krugman argumenta quase não existir correspondência entre os chamados países “GIPSI” e aqueles da Zona Euro com maior peso dos programas sociais no PIB (antes da crise) – só a Itália ocupava uma das cinco primeiras posições. Quanto à segunda versão, a exceção com algum encaixe é a Grécia, sendo que a Espanha e a Irlanda apresentavam excedentes e que Portugal tinha um défice inferior ao da Alemanha (aspecto já aqui evidenciado em gráficos inseridos pelo António Figueiredo).
Tudo visto e somado, refere então que a natureza da história é “fundamentalmente monetária” e que releva sobretudo de se ter optado por “introduzir uma moeda única sem as instituições necessárias para a fazer funcionar”. Chama-lhe até uma reinvenção dos defeitos do padrão ouro, com o consabido papel nefasto que a este se atribui no surgimento e perpetuação da Grande Depressão.
Dito isto, e no que respeita aos países mais afetados por aquilo que gosta de designar por “austerity-induced depressions”, a exclusão por impensável da hipótese de a Alemanha modificar as suas políticas de austeridade e aceitar mais inflação recondu-los a duas “más escolhas”: ou sofrer as dores da deflação (“Greek-style austerity”) ou tomar a medida drástica de abandonar o euro.
Em relação às implicações que mais o preocupam enquanto cidadão americano, Krugman não apenas vem concluir que o exemplo europeu não pode servir de fundamento para que se defenda a destruição de programas de proteção social ou o corte da despesa numa economia profundamente deprimida (“they have no idea what they’re talking about”) como vem esta semana acrescentar (“What Greece Means”) que os Estados Unidos (“our still-depressed economy”) têm alternativa, quer porque têm moeda própria quer porque têm acesso a financiamento de longo prazo em boas condições de preço (“we don’t face Greek-style borrowing constraints”).
O que corresponde a considerar a justeza de estímulos à economia (por contraponto a qualquer opção de política que se traduza numa espiral negativa de austeridade e contração económica) e, mais dirigidamente em termos políticos (“who is really trying to turn America into Greece”), a que se deva invocar a Grécia menos como uma “fábula moral sobre os perigos dos défices” e mais como “uma fábula moral sobre os perigos de tentar reduzir os défices demasiado rapidamente”…
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